Seminário define plano de lutas e quer audiência no STF sobre terceirização

Após dois dias de
intensos diálogos entre sindicalistas, magistrados e acadêmicos, o
Fórum Nacional em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores
Terceirizados encerrou o seminário que promoveu em Brasília nesta
sexta-feira (15) com um plano de lutas e a defesa de uma audiência
pública no Supremo Tribunal Federal (STF).

>> Veja aqui
o manifesto e plano de lutas aprovado pelo seminário

O Fórum
cobra que o STF avalie as pesquisas e reflexões que comprovam como a
terceirização precariza, adoece e mata os trabalhadores, jogando
contra os índices de competitividade e produtividade, conforme
destaca o documento final do encontro.

Para o diretor do
Sindicato João Marcelo Lopes, que representou os bancários de
Pernambuco no seminário, é hora de todos os trabalhadores se
mobilizarem para lutar contra as ameaças da terceirização. “Não
podemos permitir a construção do país que queremos com o
rebaixamento social do ser humano. O capital está cada vez mais
determinado e focado em seu objetivo maior: destruir a representação
Sindical, acabando o princípio basilar do Direito do Trabalho”,
comenta.

A preocupação direcionada ao STF se deve ao fato de
a instância estar prestes a decidir sobre repercussão geral
referente a ação movida pela empresa Celulose Nipo Brasileira. A
companhia foi condenada pela Justiça do Trabalho por terceirizar a
atividade-fim, algo proibido no país. A definição do Supremo
passará a referendar os demais julgamentos sobre o tema.

O
Fórum também cobrará da presidenta Dilma Rousseff a aprovação da
proposta consensuada entre as centrais e que se transformou no
Projeto de Lei 1621/2007, do deputado federal Vicentinho (PT-SP),
atualmente parado na Casa Civil.

O texto é baseado em cinco
premissas: proibição da terceirização na atividade-fim, da
intermediação da mão de obra e da subcontratação, além da
responsabilidade solidária por parte da tomadora de serviços e da
garantia de informação para os sindicatos em caso de terceirização

Radiografia da
precarização
Nas mesas desse segundo dia dirigentes
sindicais, peritos e magistrados relataram e trouxeram dados para
mostrar como a terceirização é sinônimo de retirada de
direitos.

Pesquisador e auditor fiscal do trabalho, Vitor
Filgueiras destacou dois pontos: o trabalho escravo e as mortes e
acidentes. Em relação ao primeiro ponto, nos quatro últimos anos,
90% dos 10 maiores resgates de trabalhadores submetidos a condições
análogas às de escravos eram terceirizados.

Ele vai além.
Para fugir da tentativa do setor patronal alegar que a pesquisa
abrange apenas a “má” terceirização, Filgueiras avalia o
resgate entre os formalizados, com carteira assinada. Nessa situação,
os oito maiores casos com totalidade de trabalhadores formais tinha
todos terceirizados em seus quadros.

O paralelo com os
acidentes de trabalho é semelhante. No setor da construção,
campeão em acidentes fatais, observa-se que na área de construção
de edifícios, onde o percentual de mortos é duas vezes superior à
média do mercado de trabalho 135 trabalhadores foram mortos em 2013,
75 deles terceirizados. Em obras de acabamento, com 2.32 vezes mais
incidência de fatalidades, foram 20 trabalhadores mortos, sendo 18
terceirizados. E em obras de terraplanagem, que alcança patamar de
3,3 vezes mais chances de acidentes fatais em relação à média do
mercado, das 19 mortes, 18 ocorreram entre
terceirizados.

Terceirização nos bancos – O
diretor de Organização da Contraf-CUT, Miguel Pereira, fez uma
apresentação sobre os impactos da terceirização no sistema
financeiro, onde as empresas “dizem abertamente que sua
atividade-fim é dar lucro e para isso pode terceirizar”.

Miguel
explicou que o próprio nome da entidade foi alterado em função das
terceirizações. De Confederação Nacional dos Bancários
(CNB-CUT), mudou em 2006 para Confederação Nacional dos
Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), com o propósito de
representar as mais de 500 mil pessoas que trabalham nas holdings dos
bancos mas não têm a proteção da Convenção Coletiva de Trabalho
(CCT) dos bancários.

O dirigente sindical apresentou estudo
preparado pelo Dieese para mostrar os impactos nocivos do que chamou
de “quinta onda de inovação tecnológica” no sistema
financeiro. Com as terceirizações, os bancos “esterilizaram”
os ganhos obtidos nas duas últimas décadas, fragmentaram a
categoria, reduzindo com isso a capacidade de mobilização dos
sindicatos e o conteúdo da negociação coletiva.

Segundo a
Pnad, o número de trabalhadores no sistema financeiro aumentou de
586 mil em 2002 para mais de um milhão em 2011 (último censo), mas
apenas a metade está incluída na Convenção Coletiva dos
bancários. “Consideramos que esses terceirizados são bancários
informais, porque ganham menos, trabalham mais e muitas vezes não
têm nem sindicato para representá-los”, disse Miguel
Pereira.

Com isso, o índice de sindicalização no sistema
caiu de 50% para 36% nesse período. Sindicatos de bancários são
réus em casos de interditos proibitórios por lutarem em defesa de
bancários terceirizados, sob alegação da empresa que não poderiam
atuar pela categoria. Nesse momento, Miguel fez uma critica aos
magistrados. “Se estamos entre representantes do Judiciário, é
importante que discutamos isso para apararmos nossas arestas”,
apontou Miguel.

Além desses terceirizados que realizam o
trabalho de bancários sem receberem os mesmos benefícios, há ainda
os correspondentes bancários, mini agências montadas em
estabelecimentos comerciais como padarias e mercados. Elas passaram
de 36 mil, em 2003, para atuais 405 mil unidades.

Com essa
terceirização do atendimento, cada vez mais os bancários são
pressionados a atuarem como vendedores de produtos e a baterem metas
muitas vezes inatingíveis. Fatores que aumentam o número de doenças
psíquicas, relata Miguel. “No último ano, mais de 1.600
trabalhadores foram afastados do trabalho e agora a doença não é
mais LER (lesão por esforço repetitivo), mas psicológica por conta
da pressão”, explica o diretor da Contraf-CUT.

“Bancários
estão morrendo no local de trabalho. Por infarto, em razão da
pressão, por suicídio. É um homicídio laboral”, acrescentou.
A situação fica ainda mais dramática se considerar que há
participação essencial do Estado no processo, já que os bancos são
concessões públicas e é o Banco Central quem emite resoluções
sobre o funcionamento do sistema financeiro.

“Temos que
articular os atores aqui reunidos, mas temos que ir pra rua, dialogar
com os trabalhadores. Estão em risco direitos trabalhistas e
sindicais. Isso é luta de classes. Se não compreendermos isso,
vamos perder”, convocou Miguel.

Falta de identidade
De acordo com pesquisa do Dieese de 2011, os terceirizados
realizam uma jornada de trabalho semanal com três a horas a mais em
relação aos contratados diretos e enfrentam uma rotatividade também
superior (ficam 2,6 anos no mesmo emprego contra 5.8 anos dos
contratados diretos).

Para a professora adjunta de Direito do
Trabalho na Universidade de Brasília, Gabriela Delgado, essa
discriminação gera uma ausência de identidade do terceirizado.
“Quem é esse trabalhador? É um metalúrgicos? Um professor? Um
químico? Não, é um terceirizado, que não consegue se identificar
com uma categoria”, explica.

Para o procurador do
Trabalho, Cristiano Paixão, o foco deixa de ser a ascensão
profissional e parte para a estabilidade do emprego. “A pergunta
é se vai ter o trabalho na próxima semana, se vai receber as verbas
rescisórias, se o patrão vai desaparecer. Ou se acontecerá, como
vi aqui no DF, de a empresa mandá-lo para casa esperar novo contrato
induzindo a pedir demissão.”

A professora Maria da Graça
Druck também abordou a questão da identidade e defendeu que o
momento é de dar voz a uma categoria historicamente negligenciada.
“Perguntamos se gostaria de ser terceirizados e disseram que
não, porque sabem que isso é sinônimo de sofrimento, perda de
direitos.”

Ciclo de lucro Ao tratar do
adoecimento, a professora Margarida Barreto defendeu que o
capitalismo faz a alienação do real com uma capacidade fantástica.
Vende por exemplo, a ideia do trabalhador ideal como o mais
competitivo, aquele sempre à disposição e apaixonado pelo
trabalho. Porém, o que está por trás desse discurso do
colaborador, ressalta, é alguém capturado pelo medo, pelos
acidentes e pelo sofrimento psíquico.

“O fenômeno das
doenças do trabalho não é mais o absenteísmo, mas sim o
presenteísmo. As pessoas trabalham com atestado no bolso porque têm
medo de perder o emprego”, diz.

Nesse mecanismo, analisa
o professor Ricado Antunes, a informalidade deixa de ser exceção
para virar regra e a precrarização torna-se a principal
consequência desse capitalismo dito flexível. “A terceirização
se torna o principal instrumento de lucro do capitalismo. Primeiro
para quem terceiriza e, segundo, para quem contrata os escravos”,
critica.

O procurador do Trabalho, Helder Amorim, aborda o
lado social da empresa, que deixa de existir com a terceirização
total. A “empresa vazia”, termo que emprega, se esquiva da
contratação de deficientes porque não atinge o número de
trabalhadores exigido. Se esquiva da contratação de jovens
aprendizes pela mesma razão. E diminuir o patamar de remuneração
dos funcionários, consequentemente, da contribuição social e do
financiamento da Previdência. “É uma empresa sem sentido”,
define.

Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Luiz
Philipe Filho, um país baseado na dignidade e no respeito aos
direitos humanos não pode abrir mão de impor regras a relações
trabalhistas e, portanto, não pode entender a terceirização na
atividade-fim como algo comum. “Não acreditamos que se possa
construir um país a partir do rebaixamento profissional do ser
humano”, definiu.  

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