As forças conservadoras que atuam no Congresso conseguiram, esta semana, ganhar uma batalha contra a Política Nacional de Participação Social, instituída pela presidenta Dilma Rousseff por meio do decreto 8243/14. Por 294 votos favoráveis, 54 contrários e três abstenções, os deputados aprovaram o caráter de urgência para a tramitação do Projeto de Decreto Legislativo 1491/14 , de autoria do líder do DEM, Mendonça Filho (PE), que susta a vigência do decreto presidencial.
A coalizão de forças contrárias à Participação Social estava tão bem articulada na Câmara que só não saiu vitoriosa porque PT e PCdoB entraram em processo de obstrução e acabaram derrubando o quórum necessário para cancelar o decreto presidencial. Com isso, a votação do projeto de DEM, agora em caráter de urgência, ficou para agosto. Até lá, o governo terá que articular apoio social e parlamentar para não amargar uma derrota definitiva. Não será fácil.
A proximidade das eleições estimula a polêmica que o assunto vem conquistando. Das mais de duas dezenas de partidos com representação no Congresso, somente PT, PCdoB e PSOL apoiam a Política Nacional de Participação Social. Ao lado deles estão todas as organizações e movimentos sociais, além dos intelectuais progressistas do país.
Os principais argumentos apresentados pelo grupo são que a medida está prevista na Constituição, não interfere em nada nas prerrogativas do legislativo e fortalece a democracia direta, ou seja, a participação do povo na elaboração e gestão das políticas públicas. Dentre as ferramentas que disponibiliza, as principais são os conselhos, já bastante disseminados na cultura política nacional.
Os conselhos municipais de saúde, por exemplo, estão presentes em 5.553 municípios brasileiros (apenas 17 não os têm). Os de assistência social, em 5527 têm. Nos estado de Minas Gerais, administrado pelo PSDB do presidenciável Aécio Neves, há 20 conselhos. No de Pernambuco, administrado pelo PSB do também presidenciável Eduardo Campos, 21.
Entretanto, partidos de oposição e da própria base do governo são contrários à medida, argumentando motivações moduladas de acordo com o grau de conservadorismo de cada um. Os mais reacionários afirmam que o objetivo é transformar o Brasil em um estado bolivariano, até mesmo comunista. Não falta nem mesmo quem compare os conselhos populares com os antigos “sovietes”.
Já os pretensos legalistas alegam que a política retira poderes do Congresso, ao transferi-los para o povo. E os mais moderados apelam para questões burocráticas ou metodológicas, alegando que assunto de tal relevância não poderia ser encaminhado por decreto, e sim via projeto de lei. A mídia convencional repete os argumentos ora de uns, ora de outros.
O líder do DEM – aquele mesmo que, na véspera da Copa do Mundo, dava “bola cheia para Felipão e bola murcha para a Dilma”– fez discursos tão inflamados quanto inconsistentes para condenar o decreto presidencial. Na visão de mundo de Mendonça Filho, ampliar a democracia direta significa, contraditoriamente, ser antidemocrático.
“A sociedade brasileira não aceita esse decreto bolivariano, inspirado na Bolívia e na Venezuela, e que não tem nada a ver com nossas raízes democráticas. A presidente da República pode muito, mas não pode tudo”, afirmou.
O líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), ressaltou que o decreto só organiza as instâncias já existentes de participação popular e não invade, de forma alguma, prerrogativas do Congresso, já que democracia representativa e democracia direta não são antagônicas.
“Ampliar o papel da sociedade por meio de conselhos populares não é criar um conflito entre democracia direta e democracia representativa. O decreto não cria órgão algum, apenas organiza o que já existe”, contrapôs.
Deputado de oposição ao governo, Chico Alencar (PSOL-RJ) também defendeu a política implantada pela presidenta Dilma que estimula a democracia direta. “O parlamento não tem o monopólio da representação”, argumentou.