Após julgamento, José Genoino divulga Carta Aberta ao Brasil

Carta Aberta ao Brasil

“Eles passarão, eu passarinho.”


Mário Quintana


Dizem, no Brasil, que as decisões do Supremo Tribunal Federal não se
discutem, apenas são cumpridas. Devem ser assumidas, portanto, como
verdades irrefutáveis. Discordo. Reservo-me o direito de discutir,
aberta e democraticamente com todos os cidadãos do meu país, a sentença
que me foi imposta e que serei obrigado a cumprir.


Estou indignado. Uma injustiça monumental foi cometida!


A Corte errou. A Corte foi, sobretudo, injusta. Condenou um inocente.
Condenou-me sem provas. Com efeito, baseada na teoria do domínio
funcional do fato, que, nessas paragens de teorias mal-digeridas, se
transformou na tirania da hipótese pré-estabelecida, construiu-se uma
acusação escabrosa que pôde prescindir de evidências, testemunhas e
provas.


Sem provas para me condenar, basearam-se na circunstância de eu ter sido
presidente do PT. Isso é o suficiente? É o suficiente para fazerem
tabula rasa de todo uma vida dedicada, com grande sacrifício pessoal, à
causa da democracia e a um projeto político que vem libertando o Brasil
da desigualdade e da injustiça.


Pouco importa se não houve compra de votos. A tirania da hipótese
pré-estabelecida se encarrega de “provar” o que não houve. Pouco importa
se eu não cuidava das questões financeiras do partido. A tirania da
hipótese pré-estabelecida se encarrega de afirmar o contrário. Pouco
importa se, após mais de 40 anos de política, o meu patrimônio pessoal
continua o de um modesto cidadão de classe média. Esta tirania afirma,
contra todas as evidências, que não posso ser probo.


Nesse julgamento, transformaram ficção em realidade. Quanto maior a
posição do sujeito na estrutura do poder, maior sua culpa. Se o
indivíduo tinha uma posição de destaque, ele tinha de ter conhecimento
do suposto crime e condições de encobrir evidências e provas. Portanto,
quanto menos provas e evidências contra ele, maior é a determinação de
condená-lo. Trata-se de uma brutal inversão dos valores básicos da
Justiça e de uma criminalização da política.


Esse julgamento ocorre em meio a uma diuturna e sistemática campanha de
ódio contra o meu partido e contra um projeto político exitoso, que
incomoda setores reacionários incrustados em parcelas dos meios de
comunicação, do sistema de justiça e das forças políticas que nunca
aceitaram a nossa vitória. Nessas condições, como ter um julgamento
justo e isento? Como esperar um julgamento sereno, no momento em que
juízes são pautados por comentaristas políticos?


Além de fazer coincidir matematicamente o julgamento com as eleições.


Mas não se enganem. Na realidade, a minha condenação é a tentativa de
condenar todo um partido, todo um projeto político que vem mudando, para
melhor, o Brasil. Sobretudo para os que mais precisam.


Mas eles fracassarão. O julgamento da população sempre nos favorecerá,
pois ela sabe reconhecer quem trabalha por seus justos interesses. Ela
também sabe reconhecer a hipocrisia dos moralistas de ocasião.


Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes. Não me envergonho
de nada. Continuarei a lutar com todas as minhas forças por um Brasil
melhor, mais justo e soberano, como sempre fiz.


Essa é a história dos apaixonados pelo Brasil que decidiram, em plena
ditadura, fundar um partido que se propôs a mudar o país, vencendo o
medo. E conseguiram. E, para desgosto de alguns, conseguirão. Sempre.


São Paulo, 10 de outubro de 2012

José Genoino Neto


Leia abaixo a carta de Miruna Genoino, filha de José Genoino:

“A CORAGEM É O QUE DÁ SENTIDO À LIBERDADE”


Com essa frase, meu pai, José Genoino Neto, cearense, brasileiro,
casado, pai de três filhos, avô de dois netos, explicou-me como estava
se sentindo em relação à condenação que hoje, dia 9 de outubro, foi
confirmada. Uma frase saída do livro que está lendo atualmente e que me
levou por um caminho enorme de recordações e de perguntas que realmente
não têm resposta.


Lembro-me que quando comecei a ser consciente daquilo que meus pais
tinham feito e especialmente sofrido, ao enfrentar a ditadura militar,
vinha-me uma pergunta à minha mente: será que se eu vivesse algo assim
teria essa mesma coragem de colocar a luta política acima do conforto e
do bem estar individual? Teria coragem de enfrentar dor e injustiça em
nome da democracia?


Eu não tenho essa resposta, mas relembrar essas perguntas me fez pensar
em muitas outras que talvez, em meio a toda essa balbúrdia, merecem ser
consideradas…


Você seria perseverante o suficiente para andar todos os dias 14 km pelo
sertão do Ceará para poder frequentar uma escola? Teria a coragem
suficiente de escrever aos seus pais uma carta de despedida e partir
para a selva amazônica buscando construir uma forma de resistência a um
regime militar? Conseguiria aguentar torturas frequentes e constantes,
como pau de arara, queimaduras, choques e afogamentos sem perder a
cabeça e partir para a delação? Encontraria forças para presenciar sua
futura companheira de vida e de amor ser torturada na sua frente? E
seria perseverante o suficiente ao esperar 5 anos dentro de uma prisão
até que o regime político de seu país lhe desse a liberdade?


E sigo…


Você seria corajoso o suficiente para enfrentar eleições nacionais sem
nenhuma condição financeira? E não se envergonharia de sacrificar as
escassas economias familiares para poder adquirir um terno e assim ser
possível exercer seu mandato de deputado federal? E teria coragem de ao
longo de 20 anos na câmara dos deputados defender os homossexuais, o
aborto e os menos favorecidos? E quando todos estivessem desejando estar
ao seu lado, e sua posição fosse de destaque, teria a decência e a
honra de nunca aceitar nada que não fosse o respeito e o diálogo aberto?


Meu pai teve coragem de fazer tudo isso e muito mais. São mais de 40
anos dedicados à luta política. Nunca, jamais para benefício pessoal.
Hoje e sempre, empenhado em defender aquilo que acredita e que eu ouvi
de sua boca pela primeira vez aos 8 anos de idade quando reclamava de
sua ausência: a única coisa que quero, Mimi, é melhorar a vida das
pessoas…


Este seu desejo, que tanto me fez e me faz sentir um enorme orgulho de
ser filha de quem sou, não foi o suficiente para que meu pai pudesse ter
sua trajetória defendida. Não foi o suficiente para que ganhasse o
respeito dos meios de comunicação de nosso Brasil, meios esses que
deveriam ser olhados através de outras tantas perguntas…


Você teria coragem de assumir como profissão a manipulação de
informações e a especulação? Se sentiria feliz, praticamente em êxtase,
em poder noticiar a tragédia de um político honrado? Acharia uma
excelente ideia congregar 200 pessoas na porta de uma casa familiar em
nome de causar um pânico na televisão? Teria coragem de mandar um
fotógrafo às portas de um hospital no dia de um político realizar um
procedimento cardíaco? Dedicaria suas energias a colocar-se em dia de
eleição a falar, com a boca colada na orelha de uma pessoa, sobre o medo
a uma prisão que essa mesma pessoa já vivenciou nos piores anos do
Brasil?


Pois os meios de comunicação desse nosso país sim tiveram coragem de fazer isso tudo e muito mais.


Hoje, nesse dia tão triste, pode parecer que ganharam, que seus
objetivos foram alcançados. Mas ao encontrar-me com meu pai e sua
disposição para lutar e se defender, vejo que apenas deram forças para
que esse genuíno homem possa continuar sua história de garra,
HONESTIDADE e defesa daquilo que sempre acreditou.


Nossa família entra agora em um período de incertezas. Não sabemos o que
virá e para que seja possível aguentar o que vem pela frente pedimos
encarecidamente o seu apoio. Seja divulgando esse e/ou outros textos que
existem em apoio ao meu pai, seja ajudando no cuidado a duas crianças
de 4 e 5 anos que idolatram o avô e que talvez tenham que ficar sem sua
presença, seja simplesmente mandando uma palavra de carinho. Nesse
momento qualquer atitude, qualquer pequeno gesto nos ajuda, nos
fortalece e nos alimenta para ajudar meu pai.


Ele lutará até o fim pela defesa de sua inocência. Não ficará de braços
cruzados aceitando aquilo que a mídia e alguns setores da política
brasileira querem que todos acreditem e, marca de sua trajetória, está
muito bem e muito firme neste propósito, o de defesa de sua INOCÊNCIA e
de sua HONESTIDADE.


Vocês que aqui nos leem sabem de nossa vida, de nossos princípios e de
nossos valores. E sabem que, agora, em um dos momentos mais difíceis de
nossa vida, reconhecemos aqui humildemente a ajuda que precisamos de
todos, para que possamos seguir em frente.


Com toda minha gratidão, amor e carinho,

Miruna Genoino


09.10.2012

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