Consumidores estão conseguindo na Justiça suspender cláusulas de
contratos de planos de saúde que estabelecem pesados reajustes aos 59
anos de idade. Primeira e segunda instâncias têm considerado os aumentos
abusivos e uma forma encontrada para burlar o Estatuto do Idoso, que
impede a elevação dos valores a partir dos 60 anos – autoriza apenas uma
atualização anual.
A Lei nº 9.656, de 1998, que regulamenta o setor de planos de saúde,
autoriza reajustes por mudança de faixa etária. Os percentuais de
variação, porém, devem estar expressos no contrato, e o valor fixado
para a última faixa etária – 59 anos ou mais, a partir do Estatuto do
Idoso (Lei nº nº 10.741, de 2003 – não pode ser superior a seis vezes o
valor da primeira faixa (0 a 18 anos).
Muitas operadoras de planos de saúde, porém, têm aproveitado a chegada
da última faixa etária para aplicar pesados reajustes – previstos nos
contratos. O valor da mensalidade de uma consumidora paulista, por
exemplo, subiu 60% passando de R$ 2.491,04 para R$ 3.985,67. O contrato
firmado com a Bradesco Saúde foi levado ao Judiciário e o Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) manteve sentença que declarou
nula a cláusula que previa o aumento e determinou a devolução do que foi
pago a mais.
Com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC), o relator do caso na
1ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, desembargador Claudio Luiz Bueno
de Godoy, considerou o reajuste abusivo, com “notório propósito de
evitar a incidência protetiva, e imperativa, do artigo 15 do Estatuto do
Idoso”. Por meio de nota, a Bradesco Saúde informou que “não comenta os
casos que são levados à apreciação do Poder Judiciário”.
Um cliente da Sul América Seguro Saúde também conseguiu na Justiça
suspender reajuste previsto para março, mês em que completaria 59 anos. A
mensalidade passaria de R$ 635,23 para R$ 1.200,51. “É lamentável o
reajuste de mais de 100% às vésperas do autor complementar 60 anos, o
que permitiria a aplicação do Estatuto do Idoso. Os contratos não podem
ser mais reajustados por idade, a partir dos 60 anos”, diz em sentença o
juiz Fábio Fresca, da 4ª Vara Cível do Fórum Regional do Jabaquara, em
São Paulo.
Para o advogado do consumidor, Périsson Andrade, sócio do escritório
Périsson Andrade Advogados Associados, reajustar a mensalidade às
vésperas dos 60 anos foi uma forma encontrada pelo plano de saúde para
burlar a legislação em vigor.
“Mesmo aos 59 anos, não se pode impor um pesado reajuste, que venha
justamente a fraudar a aplicação posterior do Estatuto do Idoso”,
afirma. A Sul América já recorreu da sentença ao TJ-SP e, por meio de
nota, informou “que tem por norma não comentar decisões judiciais,
especialmente aquelas que não são definitivas e sobre as quais ainda
cabe recurso”.
Em Minas Gerais, o Tribunal de Justiça (TJ-MG) também manteve decisão
que afastou aumento de mensalidade aplicada pela Unimed Uberaba –
Cooperativa de Trabalho Médico. O plano de uma consumidora foi
reajustado em 146%. O relator do caso na 11ª Câmara Cível, desembargador
Wanderley Paiva, declarou nula a cláusula que previa a alteração aos 59
anos, seguindo dispositivos do CDC e do Estatuto do Idoso.
No entanto, atendendo a um pedido da empresa, o magistrado concedeu um
reajuste menor, que deverá ser calculado na liquidação da sentença,
“pela média do percentual utilizado ao longo de todo o contrato
celebrado entre as partes”. O Valor não conseguiu encontrar
representantes da Unimed Uberaba para comentar a decisão.
A discussão deve agora bater às portas do STJ, que já firmou
jurisprudência contra reajustes abusivos aplicados aos 60 anos, mesmo
para consumidores que atingiram essa faixa etária antes da vigência do
Estatuto do Idoso.
Para o advogado Gilberto Bergstein, do escritório Marques e Bergstein
Advogados Associados, a tendência é de os ministros adotarem o mesmo
entendimento para os aumentos aos 59 anos. “São reajustes abusivos. O
STJ não vai aceitar essa estratégia adotada com o nítido propósito de
burlar o Estatuto do Idoso”, diz.
Como os contratos de planos de saúde são de longo prazo – e contêm
normalmente cláusula de renovação automática -, o Judiciário entende que
estão sempre sujeitos às novas leis, de acordo com o advogado. “Por
isso, o Estatuto do Idoso tem sido aplicado mesmo nos contratos
celebrados antes de sua vigência.”