O Brasil avançou muito nos últimos anos, do ponto de vista jurídico e de políticas públicas, no combate à homofobia. Entretanto, na avaliação do assessor de políticas públicas da Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual da prefeitura do Rio, Sérgio Camargo, o preconceito ainda é um grande entrave.
“O mês de maio não é apenas o mês das mães, mas também de combate a esse terror que se tornou a homofobia e consagra a decisão do Supremo que, em maio do ano passado, equiparou as uniões heteroafetivas às uniões estáveis homoafetivas”, comentou. “Outro exemplo de avanço é a Lei 2.475, de 1996, que pune estabelecimentos comerciais e órgãos públicos na cidade do Rio por discriminação sexual”, destacou Camargo que participou hoje (17), Dia Internacional de Combate à Homofobia, do Seminário Jurídico de Promoção da Diversidade Sexual e da Identidade de Gênero.
O encontro foi organizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela prefeitura do Rio e reúne, na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, integrantes do movimento de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), autoridades e acadêmicos que estudam a questão da diversidade sexual.
Um dos estudos apresentados no seminário, realizado pela Faculdade de Direito da UFRJ, aponta que o número de decisões judiciais favoráveis às causas LGBT duplicou em um ano, após a decisão do Supremo Tribunal Federal, passando de pouco mais de mil decisões para cerca de 2 mil.
O coordenador da pesquisa, Marcos Vinicius Torres, que também é membro da Comissão Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), deu início à coleta de assinaturas para o Projeto de Lei do Estatuto da Diversidade Sexual, por iniciativa popular, a ser encaminhado ao Congresso Nacional.
“Precisamos de uma legislação específica sobre a matéria, sobretudo, sobre questões de direito de família, como o casamento civil, pois a união estável é um avanço, mas não dá todos os direitos que o casamento dá. Outro foco do estatuto é a criminalização da homofobia, que engloba o Projeto de Lei 122/2226 que está parado no Congresso.”
A PLC 122, de 2006, torna crime a discriminação por motivo de orientação sexual e é a principal reivindicação dos grupos defensores dos direitos LGBT. A proposta enfrenta grande resistência, sobretudo, por parte de parlamentares da bancada evangélica que condenam as práticas homossexuais.
O presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, comparou o caso do Brasil, onde o projeto de criminalização da homofobia tramita há cerca de dez anos no Congresso Nacional, com o de outros países da América do Sul. Ele lembrou que o congresso argentino aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2010, enquanto os parlamentares chilenos aprovaram rapidamente a criminalização da homofobia, no mês passado, após o assassinato de um jovem homossexual.
A cada um dia e meio, um homossexual é assassinado no Brasil – A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República registrou em 2011 uma média de 3,4 denúncias diárias de violência praticada contra homossexuais. As 1.259 denúncias foram recebidas de forma anônima pela secretaria por meio do telefone 100 do Disque Direitos Humanos. De acordo com os relatos, há queixas sobre violência física, sexual, psicológica e institucional, além de episódios envolvendo discriminação relacionada à opção sexual do indivíduo.
Entre os estados que mais registraram queixas estão São Paulo (210), o Piauí (113), a Bahia e Minas Gerais (105 cada), e o Rio de Janeiro (96). Porém, de acordo com especialistas, a maioria dos governos – estaduais e municipais – não faz levantamentos sobre o número de crimes praticados contra homossexuais.
A estatística nacional mais aproximada é produzida pela entidade GGB (Grupo Gay da Bahia), que faz sua contagem por meio de notícias publicadas na imprensa. Segundo o levantamento, em 2011 ocorreram 266 homicídios – um recorde desde o início dos levantamentos na década de 1970. De acordo com o GGB, foi o sexto ano consecutivo em que houve aumento desse tipo de crime.
“A relação é que a cada um dia e meio ocorre uma morte. O Brasil é um país relativamente perigoso para homossexuais”, disse o presidente do GGB, Marcelo Cerqueira. “Não temos muito o que comemorar neste 17 de maio. Além da questão da violência, ações como o kit de combate à homofobia e a campanha de combate à aids no carnaval (com foco na comunidade LGBT) foram vetados pelo governo.”
Para tentar estimular a denúncia e contabilizar os crimes de intolerância contra homossexuais, o governo criou há um mês uma forma de se registrar boletins de ocorrência pela internet, lembrou Heloisa Gama Alves, a coordenadora de Políticas para a Diversidade Sexual da Secretaria de Estado da Justiça. O número de sanções aplicadas no estado subiu de 33 em 2010 para 63 em 2011, segundo ela.
Atualmente, agressões e injúrias praticadas contra homossexuais são punidas com base no Código Penal. “O crime de intolerância não é um crime praticado só contra uma pessoa. É uma agressão a toda a sociedade e, por isso, muito mais grave”, disse a defensora pública Maíra Coraci Diniz, do Núcleo de Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito, da Defensoria Pública de São Paulo.
No Brasil, foram documentados 260 assassinatos de gays, travestis e lésbicas em 2010. Isso significa que, a cada 36 horas, um homossexual é morto no país. De acordo com dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), o risco de um homossexual ser assassinado no Brasil é 785% maior que nos Estados Unidos.
A data – Há 22 anos, no dia 17 de maio, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou da listagem de doenças a palavra homossexualismo e, desde então, os movimentos LGBT de todo o mundo promovem manifestações e atividades voltadas para o combate ao preconceito e à intolerância a homossexuais. No Brasil, o Ministério da Saúde retirou essa expressão da lista de doenças em 1985.