Na hora do parto, o Brasil não segue as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Por incrível que pareça, os hospitais particulares são os que menos obedecem. Segundo a OMS, o país não deve ultrapassar 15% dos partos cesarianas. Hoje, os nascimentos com cirurgias chegam a 52%.
Em São Paulo, os números são ainda maiores. Só nos primeiros quatro meses de 2011, as cinco mais conceituadas maternidades particulares da cidade tiveram, em média, 89,18% de cesáreas.
Parto normal, criança saudável – O índice de mortes associadas à cesariana é quase quatro vezes maior do que no método natural, segundo o Ministério da Saúde.
As crianças que nascem sem ajuda de cirurgião também têm mais saúde. É o que prova o estudo feito com 2.250 crianças, realizado no Canadá. Cinquenta e oito por cento das que vieram ao mundo de forma natural têm menos problemas respiratórios. Outro dado curioso é que a obesidade pode estar relacionada à forma de nascimento.
Durante 25 anos, a Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto acompanhou 2.057 pessoas do nascimento até os 25 anos de idade, os jovens que nasceram de cessariam 15,2% tinham índice de massa corporal acima de 30, definido como obesidade. A gastroenterologista Helena Goldani ajudou na elaboração da pesquisa Ela explica que um dos motivos da obesidade é a falta de contato da criança com a flora vaginal da mãe. E essa falta do contato pode afetar a flora intestinal do filho e, no futuro, ela pode vir a ter problemas de peso.
Desinformação no nascimento – O médico Gonzalo Vecina Neto é superintendente corporativo do Hospital Sírio-Libanês. Quando o assunto é cesariana, ele é rápido na resposta sobre os motivos dos altos índices. “O médico não quer ter trabalho, a mãe tem medo. Quando os dois se unem, a criança nasce de cesárea”. Gonzalo ressalta que se a mãe tivesse mais informação este quadro poderia mudar. “Erroneamente a mãe acha que ter um filho pela vagina dói e que isso vai atrapalhar nas relações sexuais do casal. Hoje, é possível que a criança nasça sem dor tanto para ela quanto para a mãe”, diz.
Para isso acontecer, o médico precisa informar a grávida. Gonzalo conta que o aumento da cesariana foi tanta que até ganhou apelido: “parto Guarujá”. A mulher não quer atrapalhar o final de semana na praia e marca data e hora para ter o filho, explica o médico.
A baixa procura de nascimentos através da vagina no Brasil virou motivo de estudo. Pesquisadores da Escola Nacional de Saúde (Enasp) vão entrevistar 24 mil pacientes de hospitais públicos e privados para descobrirem o motivo da alta incidência de cesarianas no país. O anúncio do resultado da pesquisa está previsto para o final do ano.
O convencional que virou raro – Há mulheres que têm condições financeiras de pagar anestesia, mas optam por um parto mais tradicional, sem anestesia e com mais contato humano e menos intervenções médicas. Este parto é chamado de parto humanizado. Ele pode ser feito na residência da mãe. Entretanto, ao contrário de países europeus, não é muito utilizado no Brasil. A casa de Parto Sapopemba, na Zona Leste da capital, é um destes locais. Em contramão dos hospitais, lá não existem aparelhos cirúrgicos ou a opção de cesáreas. As pacientes não são tratadas como doentes e são chamadas pelo nome. Parece uma casa. A ausência dos equipamentos cirúrgicos se deve ao parto ser uma questão fisiológica e não médica. Mas caso de a mãe ter complicações, ela é encaminhada imediatamente a um hospital, mas estes casos são raros.
O Grupo de Apoio à Maternidade Ativa (GAMA) estimula o parto humanizado e auxilia mulheres que optam por ele. A instituição acredita que essa modalidade é mais afetuosa, além disto, elas ensinam técnicas durante a gestação que amenizam a dor do parto.
Quem dá as dicas são as “doulas”, mulheres que estudam para auxiliarem as mães antes, durante e depois da maternidade. Mariana Mesquita é “doula” há mais de dez anos. Ela conta que um dos principais motivos para as mães procurarem o grupo é o apelo sentimental. “Elas chegam bravas, pois são tratadas como crianças durante a gestação. Todas querem vivenciar cada momento da nova vida que estão gerando, principalmente segurar o bebê por longo tempo após o nascimento – gesto impossibilitado no parto cirúrgico pelo alto risco de infecção”.