STF pode julgar ação da CNA contra lista suja do trabalho escravo

O
Supremo Tribunal Federal (STF) pode julgar a qualquer momento, após
o fim do recesso forense, uma ação da Confederação Nacional da
Agricultura e Pecuária (CNA) contra a lista suja do trabalho
escravo, divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O
relator do processo no Supremo, ministro Carlos Ayres Britto, liberou
o caso para julgamento no fim de novembro. 

O cadastro de
empregadores flagrados explorando mão de obra análoga à de
escravos foi criado em 2004 pelo MTE, para combater esse tipo de
prática. Atualmente, 294 empresas e pessoas físicas estão
incluídas na lista – um número recorde desde a sua criação. 

Entre
os infratores estão madeireiras, grupos sucroalcooleiros,
construtoras e empresários. Inserido no cadastro, o infrator fica
impedido de obter empréstimos em bancos públicos e passa a sofrer
uma série de restrições comerciais. Segundo o ministério, a lista
tem sido uma forma importante de combate ao trabalho escravo no
Brasil.

Mas a medida desagradou a CNA. Na ação direta de
inconstitucionalidade (Adin) que tramita há quase oito anos, a
entidade questiona a Portaria nº 540, editada em 15 de outubro de
2004 pelo Ministério do Trabalho para criar o cadastro. Para a
confederação, a portaria fere o artigo 22 da Constituição
Federal, segundo o qual a competência para legislar sobre direito do
trabalho é exclusiva da União. O assunto demandaria a publicação
de uma lei, aprovada pelo Congresso Nacional, ao invés de uma
portaria ministerial.

Ao defender a lista no STF, a
Advocacia-Geral da União (AGU) irá argumentar que a portaria
simplesmente regulamenta questões definidas em lei. Portanto, não
haveria violação às regras da Constituição. “A Portaria 540
não estabelece punição para os empregadores responsáveis por
reduzir trabalhadores à condição análoga à de escravo, tampouco
confere ao ministro de Estado do Trabalho e Emprego competência para
julgar imotivadamente quem quer que seja”, diz a AGU. “Antes,
limita-se a criar cadastro de empregadores faltosos.” 

Outro
argumento da CNA é de que a lista suja violaria a presunção da
inocência, ao incluir nomes de pessoas sem que haja um processo
judicial prévio. A inclusão do nome no cadastro é feita depois de
concluído um processo administrativo referente ao processo de
fiscalização conduzido por auditores do trabalho. 

Diversas
empresas entraram com ações na Justiça dizendo que seus nomes só
poderiam ser divulgados nessa lista após uma decisão judicial
definitiva. “Embora o combate ao trabalho escravo tenha que ser
feito, ninguém pode ser considerado culpado antes de decisão
judicial transitada em julgado”, diz o advogado trabalhista
Daniel Chiode, do escritório Fleury Malheiros, Gasparini, De Cresci
e Nogueira de Lima Advogados. Para ele, a portaria confere direitos
excessivos aos auditores, abrindo margem para excessos e inclusões
com motivações políticas ou econômicas. Os processos que correm
na Justiça do Trabalho estão suspensos aguardando posicionamento do
Supremo.

Diversas entidades pediram para serem incluídas na
ação da CNA, para defender seus pontos de vista no STF. Uma delas é
a Confederação Nacional do Comércio. As associações dos
magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), dos procuradores da
República (ANPR) e dos juízes federais do Brasil (Ajufe) defenderão
a legalidade da portaria. 

Um dos argumentos é que o
cadastro não pode ser considerado ilegal porque não cria direitos
nem obrigações – teria caráter meramente informativo. “A
lista somente torna público o resultado decorrente de processo
administrativo com decisão final, e esses processos não são
sigilosos”, afirma o vice-presidente da Anamatra, Paulo
Schmidt.

A Conectas Direitos Humanos, que também entrou como
parte interessada na ação, argumenta que não é necessária uma
decisão judicial definitiva para incluir um nome na lista suja do
trabalho escravo. “As pessoas não vão parar nesse cadastro
arbitrariamente”, diz o advogado Oscar Vilhena, diretor da
escola de direito da FGV em São Paulo, que atuou na defesa da
Conectas. “E quando a Constituição diz que todos têm garantia
à presunção da inocência, ela se limita ao processo penal. Mas
essas pessoas não estão sendo punidas na esfera penal.”

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