Só no Brasil há saúde gratuita e universal, mas gasto privado maior

O Sistema
Único de Saúde (SUS) completou nesta segunda-feira (19) 21 anos
exibindo um paradoxo. O Brasil é o único país do mundo que tem uma
rede de saúde gratuita e aberta a toda a população e, ao mesmo
tempo, vê o mercado (convênios e consultas particulares) gastar
mais dinheiro do que o Estado.

O motivo da contradição,
dizem especialistas, é a falta de recursos públicos para fazer com
que o SUS se realize plenamente, tal qual previsto na Constituição,
o que exigiria pelo menos dobrar seu caixa.

As despesas com
saúde no Brasil são de 8,4% do chamado produto interno bruto (PIB),
a soma das riquezas produzidas pelo país durante um ano. Deste ponto
de vista, o investimento está em linha com a média global, de 8,5%
anuais, segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS).

A distinção está em quem puxa os gastos. No Brasil, 55%
são privados (e beneficiam cerca de 46 milhões de conveniados) e
45%, públicos – favorecem todos os 190 milhões de brasileiros.

A
fatia estatal representa 3,7% do PIB, um terço mais baixo do que a
média internacional, de 5,5% do PIB, de acordo com a OMS. No resto
do mundo, o gasto público equivale a 60% do total investido em
saúde.

Quando se faz comparação com países com sistemas
similares ao SUS – universais e gratuitos -, a disparidade é
maior.

No Reino Unido, cujo modelo montado depois da Segunda
Guerra Mundial é considerado clássico e inspirou o brasileiro, a
despesa pública com saúde gira em torno de 7% do PIB. O Estado
britânico responde por 82% dos gastos totais, os quais são de
patamar semelhante aos do Brasil (8,7% do PIB).

No Canadá,
que também conta com sistema público, o governo gasta cerca de 7%
do PIB em saúde e o setor privado, 2,8%.

Em dois países
escandinavos que são exemplo na área, Noruega e Suécia, o Estado
gasta mais de 6% do PIB e responde por 72% do investimento em saúde.

“Se comparado com outros países do mundo que adotaram o
sistema universal de saúde, o Brasil gasta muito pouco”, diz o
médico e ex-ministro da Saúde Humberto Costa, atual líder do PT no
Senado.

“O SUS tem um saldo positivo inegável nesses anos
todos, mas tem esse paradoxo: é um sistema público e universal que
gasta menos do que o setor privado”, diz Solon Magalhães Vianna,
um dos relatores da Conferência Nacional de Saúde que, em 1986,
esboçou o SUS.

Novas fontes – Para Vianna, o gasto
público em saúde deveria duplicar, o que requer novas fontes de
recursos para o setor. É a mesma posição do ex-ministro da Saúde
Adib Jatene.

“Quando o SUS foi criado, diziam que era
inviável, que os contituintes tinham sido irresponsáveis ao não
apontar fontes de financiamento. Mas a Constituição apontou as
fontes, nas disposições transitórias, só que elas nunca foram
regulamentadas”, diz Jatene. “Eu estimo que o orçamento do SUS
precise dobrar, mas não há nenhuma possibilidade de dobrar.”

Na
avaliação de outro ex-ministro, José Gomes Temporão, é
“significativo” o dado da OMS sobre o gasto privado superar o
público no Brasil. Especialmente porque, enquanto o investimento
estatal obedece a uma política nacional, o privado às vezes termina
em plásticas.

“Na Argentina, 70% dos gastos com saúde são
públicos. Aqui no Brasil, quem está arcando com o acesso à saúde
são as famílias”, disse. “É importante a sociedade ter clareza
que, ao investir no SUS, está investindo num patrimônmio que a
sociedade construiu nos últimos 22 anos”.

O secretário de
Saúde da prefeitura de São Paulo, Januário Montone, tem a mesma
visão orgulhosa do sistema que faz aniversário. “O SUS foi uma
vitória fantástica. É um sucesso, não existe nenhum sistema de
saúde desse tamanho em nenhum lugar do mundo”, disse.

Ele é
defensor da ampliação dos recursos para a saúde. Mas acredita que,
depois de 23 anos da Constituição, o país precisa rediscutir o
sistema de saúde e decidir se a iniciativa deve ou não participar
dele. E, na opinião dele, deve. Até porque o próprio Estado
precisa contratar serviços privados.

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