Polêmica mitológica

Por
Hugo Rafael Freitas de Lima


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Nada provoca tanta
polêmica quanto os assuntos relacionados ao comportamento humano.
Isto porque os indivíduos são seres sociais e as relações entre
si dependem de comportamentos. Os parâmetros para definição dos
comportamentos que devem ser adotados formam os diversos tipos de
sociedade. As “regras do jogo” devem refletir os valores da
coletividade. Por isso, existem sociedades cuja base de ordenamento é
a religião, a moral…outras a economia, o bem-estar, etc. Para cada
uma delas a matriz comportamental é intrinsecamente ligada aos
valores elegidos ou mesmo determinados. As normas de conduta, devem
amparar-se, e com ela todo ordenamento jurídico e suas leis, em tais
valores.

O Brasil de muitos valores é visto como o país da
pluralidade, o que é divulgado como um ponto positivo quando se tem
como fim o ideal de democracia e liberdade. Na prática, contudo, não
é bem assim. A terra de tantas caras e cores, falas e gostos,
termina por ficar sem identidade própria. Não existe um “tipo
brasileiro”. Existem, sim, incontáveis personagens, encontrados
neste continente chamado Brasil. Pela sua forma de colonização,
pela miscigenação das raças, com origens e costumes
(comportamento!) completamente diferentes, seria muito esperar que em
pouco mais de meio milênio, além de uma bandeira e um hino
tivéssemos também um modelo nacional. Analogia à descoberta no
campo da física, (pelo inglês Isaac Newton) sobre as cores, poderia
ser feita em relação à situação brasileira. Em Newton, prova-se
que as cores sobrepostas provocam a percepção do branco, da
ausência de cores. Assim a sobreposição dos valores, como num
circulo cromático em movimento, ou melhor, como num circulo
valorativo em constante movimento social, dá a sensação de
ausência de valores.

Torna-se ainda mais complexo quando
estes valores são concorrentes e até antagônicos. O desafio é a
convivência harmoniosa entre eles. Em tese ,
quanto maior as desigualdades sociais e culturais maior o conflito de
valores.

Com os animais e plantas resolve-se a partir
do melhoramento genético, obtendo indivíduos ou
populações com características semelhantes e desejáveis, mas com
seres humanos, diferente do entendimento nazista, são os valores e
principios, as ideias num âmbito maior, que caracterizam e
identificam um grupo. Diante de tanta divergência de pensamentos,
convencionar um entendimento sobre determinado tema é algo
extremamente complicado.

No Brasil, as questões da
legalização da maconha, legalização do aborto e reconhecimento da
união homoafetiva, dentre outas, precisam ser equacionadas, mas as
ideias contra ou a favor não se amparam num pensamento
personalizado, ou seja, não são os valores nacionais que sustentam
as posições atuais. É pelo mito formado acerca de tais assuntos
que nos posicionamos, ou melhor, não se tem opinião formada com
clareza em relação ás questões. E por isso, poucos ou nenhum
político, inclusive legisladores, arriscam-se ao menos a falar sobre
problemas desta natureza.

Numa sociedade indígena, tida como
arcaica, existe uma definição muito decifrável de valores. Talvez
em alguma etnia indigena, o oborto seja condenável, mas certamente
existe um porquê. Noutra pode ser permitido e até lauvável como
sacrificio aos deuses! O fato é que existem valores coletivos,
enraigados e condutivos.

O desapego às ideias preconcebidas,
a libertação dos dogmas e a relativização de pontos de vistas são
muito bem-vindos, mas de nada adianta caso não se tenha o
entendimento pleno da questão em debate. A informação imparcial,
verídica, deve balizar este entendimento, donde, a partir de então,
decide-se pela modificação ou permanencia de determinado
comportamento, considerando-se entretanto os valores da sociedade.

Vale considerar que os valores de uma sociedade devem ser
moldados a partir do entendimento e opiniões dos individuos que a
compõe. Do contrário, quando os valores formam as opiniões sem que
haja o entendimento concreto das questões, dar-se-a luz à alienação
social, tão nociva quanto à falta de valores.


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Hugo Rafael Freitas de Lima é bancário do Banco do Nordeste do
Brasil (BNB) em Pernambuco

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