“Indignados” espanhóis debatem futuro do movimento

Não
temos que ter medo de sair daqui. Não é isso que vai nos
desorganizar. Podemos ir embora, mas já sabemos o caminho de volta”,
disse um dos indignados presentes à assembléia geral na Praça
Catalunya. A assembléia discutiu estratégias para se deixar o local
central dos protestos em Barcelona, expandindo o movimento a outras
áreas da cidade e do país. Tendo em vista que o movimento dos
indignados vem perdendo espaço na grande imprensa e lembrando o fato
de que ele surgiu como uma mobilização espontânea a partir das
mídias sociais, agora só há uma alternativa: a comunicação
alternativa. O artigo é de Fabíola Munhoz.

“Isso aqui não é um parlamento”. A frase foi
dita por um dos indignados da Praça Catalunya, durante a Assembleia
Geral realizada no último domingo (5/6), com a finalidade de
discutir, dentre outros temas, estratégias para se deixar o local
central dos protestos em Barcelona, expandindo o movimento a outras
áreas da cidade e do país.

A reclamação do manifestante se deu
durante a votação de propostas para a desocupação da praça, em
que os ânimos se acirraram porque alguns dos presentes interrompiam
a contagem dos votos, carregando cartazes a favor da permanência do
acampamento.

“Não estamos reunidos aqui para ver quem ganha,
mas sim, para somar forças”, continuou o mesmo jovem, pedindo a
todos que mantivessem a disposição para o diálogo e a busca por
decisões tomadas em consenso. No entanto, se a grande quantidade de
pessoas reunidas na praça já era um obstáculo à contagem fiel dos
votos antes, quando os temas tratados despertavam opiniões mais ou
menos parecidas, agora, que o movimento cresce em complexidade e
discordância interna, a democracia perseguida pela dinâmica da
assembleia torna-se ainda mais difícil de ser alcançada.

“Estamos
tentando melhorar a metodologia usada até agora, mas não tem sido
fácil. Por isso, a Comissão de Organização da Assembleia está
sempre aberta a propostas”, pedia calma uma das duas garotas que
eram porta-vozes no encontro de domingo.

Seguindo a lógica de se
dividirem as ações do movimento por grupos de trabalho, e diante da
importância das definições sobre como e quando sair da praça, foi
criada uma Comissão de Continuidade. Esse grupo é responsável por
planejar a transição da acampada a outros tipos de ativismo, sem
que, com isso, percam-se a visibilidade e o poder de mobilização,
alcançados até agora pelos indignados.

Os participantes de tal
célula do movimento têm se reunido diariamente desde quinta-feira
passada, e apresentaram no domingo algumas ideias postas a votação.
A primeira delas é a de que seja levantado acampamento já ao longo
desta próxima semana, porém, sem uma data definida para que isso
ocorra de fato. Segundo uma jovem catalã que lia a proposta, a saída
da praça ocorreria quando se mostrasse “logisticamente viável e
politicamente clara”.

A definição, vaga demais, não pareceu
ter sido compreendida pelas pessoas que votavam a favor. “O que
significa uma saída politicamente clara?” perguntei a uma jovem de
cabelo vermelho que, sentada ao meu lado, levantava a mão para
mostrar que estava de acordo com a sugestão apresentada. “Não
sei”, respondeu. Ela, assim como os muitos outros que deram seu sim
duvidoso à proposta, demonstrava mais ânsia pela expansão e pela
transformação do movimento do que temor frente às incertezas.

O
imigrante de Senegal, chamado Ibrahima, que freqüenta a praça todos
os dias e luta por melhores condições de trabalho na fábrica onde
atua como soldador, também é contra a permanência dos acampados na
Praça Catalunya por mais tempo. “Algumas pessoas pensam que vão
morar para sempre na praça. E isso não é possível. Aqui também
um lugar turístico, que precisa ser mantido limpo”.

Escutava
essas palavras e observava um grupo de músicos tocando em local
próximo a uma das entradas da praça, quando fui convidada a sair do
canteiro que tinha escolhido como lugar alto e privilegiado para
assistir ao espetáculo. “Vocês não podem ficar aqui”, fui
avisada por um casal que havia montado sua tenda ao lado e pedia para
que eu e outras pessoas não ocupassem seu “quintal”, enquanto
cercavam o espaço para impedir novas “invasões”.

Digressões
divertidas à parte, a segunda proposta de continuidade votada no
domingo foi de que as Assembleias Gerais já não sucedam todos os
dias, mas sim, três vezes por semana, para que as comissões tenham
mais tempo de refletir e debater planos de trabalho e princípios
antes de que tais ideias sejam levadas a julgamento de todos. Como
essa mudança também foi aprovada pela maioria dos presentes, a
próxima assembleia acontece hoje, terça-feira (7/6). E as seguintes
serão sexta e domingo.

Assim, embora tenha sido aprovado o
abandono da praça nos próximos dias, esse plano prevê a manutenção
da Praça Catalunya como ponto central de articulação e informação
do movimento. Ali continuarão a ser realizadas atividades diurnas,
como debates e oficinas, em paralelo a dinâmicas parecidas em outras
praças e bairros da cidade. A transformação da acampada pretende,
portanto, apenas impedir que as pessoas continuem dormindo na praça,
já que essa situação tem sido acompanhada de problemas, como
inseguridade, desorganização e cansaço.

Portanto, as
Assembleias Gerais seguirão como mecanismo de decisão, e a Comissão
de Continuidade propõe agora a busca de outro local, como ponto de
encontro alternativo à Praça Catalunya, onde também possam ser
realizados debates públicos que afetem o movimento espalhado por
toda a cidade. Levantaram-se as hipóteses de que esse novo espaço
seja pedido à Prefeitura de Barcelona ou de que ele seja conquistado
com a ocupação de algum prédio público.

Essa última opção
seria mais coerente com o lema do movimento de que “Ninguém nos
representa”, mas deixaria de respeitar a opinião dos reformistas
que também fazem parte do coletivo de manifestantes. Por isso, o
debate vai longe, assim como está distante de um consenso o tema das
estratégias políticas e comunicativas do movimento.

Apesar de a
acampada contar com Comissões de Comunicação e Audiovisual
próprias, além de mídias sociais, blogs e listas de e-mail,
providenciados como instrumentos informativos por cada uma das outras
comissões temáticas, ainda há receio de parte do coletivo quanto à
possível perda de espaço na imprensa convencional. Por isso, tanta
dúvida quanto a sair ou não da Praça Catalunya, que se tornou
símbolo da luta dos indignados aos olhos da mídia internacional.

Sobre esse ponto, merece citação outra fala do autor da frase
que inicia este texto: “Não temos que ter medo de sair daqui. Não
é isso que vai nos desorganizar. Podemos ir embora, mas já sabemos
o caminho de volta”. Tendo em vista que o movimento dos indignados
só vem perdendo espaço na grande imprensa e lembrando o fato de que
ele surgiu como uma mobilização espontânea a partir das mídias
sociais, agora só há uma alternativa: a comunicação alternativa.

Expediente:
Presidente: Fabiano Moura • Secretária de Comunicação: Sandra Trajano  Jornalista ResponsávelBeatriz Albuquerque • Redação: Beatriz Albuquerque e Brunno Porto • Produção de audiovisual: Kevin Miguel •  Designer Bruno Lombardi