Brasil tem 20 bancos na fila aguardando autorização para operar

O sistema financeiro não enfrenta
problemas em nenhum dos seus segmentos e no curto prazo devem nascer
mais bancos do que morrer. A visão é do diretor de Fiscalização
do Banco Central (BC), Anthero Meirelles, que concedeu entrevista ao
Valor. Segundo ele, há uma fila de 20 bancos aguardando autorização
de funcionamento, incluindo instituições locais e
estrangeiras.

Mesmo com um processo de consolidação dos
bancos pequenos e médios em andamento que, diz ele, é uma
consequência natural da crise de 2008, o Brasil deve ter, daqui
alguns anos, mais bancos do que tem hoje. “Não vejo no
horizonte um movimento de concentração”.

Os sete
maiores bancos respondem por 81% dos ativos do sistema financeiro,
enquanto as 36 instituições caracterizadas pelo BC como médias
ficam com 16% do total. Os 95 restantes têm 3% do total. A divisão
permaneceu praticamente estável nos últimos trimestres, diz. “Esse
é um nível de concentração normal na indústria bancária”.

Ele reconheceu, no entanto, que os menores terão que
“adaptar suas estratégias” e reforçar suas estruturas de
capital para enfrentar a nova realidade de mercado financeiro. Para
isso, a saída encontrada foi a associação com outras instituições,
processo em andamento e que pode incluir até mesmo parceria com
estrangeiros. “Há alguns negócios em curso, consequência
dessa mudança estrutural da indústria bancária”, diz
Meirelles, responsável por monitorar o bom funcionamento do sistema
financeiro.

Neste ano, dois bancos apresentaram problemas. O
Morada, hoje sob intervenção do BC, e o Schahin, comprado pelo BMG.
Segundo Meirelles, além do impacto negativo da crise, que trouxe
dificuldades de liquidez, houve recentemente o caso PanAmericano, que
colocou em cheque a principal fonte de recursos (funding) dos bancos
médios: a cessão de carteira.

O diretor avalia que a prática
de originar e ceder parte da carteira de crédito, que hoje
representa cerca de 5% do estoque de empréstimos do sistema, tem
sido questionada no mundo todo, pois a instituição financeira abre
mão de parte importante do lucro. Segundo ele, os bancos podem usar
o instrumento, mas eles não podem depender apenas dele para se
capitalizar. “Esses bancos (pequenos e médios) precisam
aumentar o capital para poder reter parte do crédito que eles
originam. É isso que vemos nesse movimento de consolidação”.

O diretor disse que o mais importante para as instituições
de pequeno e médio portes é reforçar as estruturas de capital.
“Alguns bancos precisam adaptar suas estratégias para ficar
mais rentáveis e sustentáveis no longo prazo. Se têm passivo caro
e ativo menos rentável, no médio e longo prazo podem ter
dificuldade”, afirma.

A capitalização do sistema é
considerada “boa”, mesmo entre os médios, que possuem
índice de Basileia de 15,6%. O índice de Basileia do sistema é de
16,9% e todos os segmentos possuem capital de nível 1 acima de 11%.
Ele acredita que a adaptação aos padrões de Basileia 3 (regras
criadas no pós-crise) não deve trazer dificuldades. “Pelas
nossas contas, os poucos bancos que precisam fazer ajustes têm
plenas condições de se adaptar apenas retendo mais resultado.”

O
fato de o Brasil ter passado pela crise sem quebras de bancos também
foi ressaltado pelo diretor. Como lembra Meirelles, as autoridades
financeiras de países como Espanha e Estados Unidos estão até hoje
tentando solucionar os problemas originados há cerca de três anos.
“No Brasil, a indústria passa por uma transformação, com
consolidação e mudança na estrutura de segmentos, mas esse é um
movimento que o próprio mercado está promovendo. Não é articulado
pelo BC.”

As palavras de Meirelles deixam transparecer
que o BC não vê com preocupação o atual processo de consolidação
dos bancos médios. “Determinados nichos que não despertavam
interesse dos grandes bancos, passaram a atrair essas instituições,
como o financiamento de veículos e o crédito consignado. Há uma
mudança estrutural e as forças competitivas estão se alterando. É
normal que a uma mudança dessas sigam-se movimentos de consolidação.
Bancos que não estavam bem buscam mudar seu modelo. Consolidação e
mudanças, ainda mais após uma crise como a de 2008, são normais”,
diz.

Segundo ele, o processo é seguido de “perto”
pelo BC, pois o resultado final é “importante” para o
sistema, mas não há interferências. “Nós acompanhamos, mas
não são movimentos que precisem ser orquestrados pela autoridade
financeira, como é o caso dos EUA, Espanha e de outros países
europeus”, ressaltou.

Ele também negou que haja
problemas que afetem o sistema financeiro. “O sistema é
bastante sólido. Não temos nenhum problema localizado em segmentos.
Evidentemente que a indústria é dinâmica e é normal que tenhamos
casos isolados de instituições em situação especialmente boa e
outras em situação um pouco pior. O Morada estava em situação
ruim. Mas em termos do sistema ele era quase desprezível,
representando menos de 0,01% dos ativos”, diz.

Antes
diretor de Administração, Meirelles assumiu a nova função no
início do ano. Neste mês, a diretoria de Fiscalização sofreu uma
série de alterações — dentro de uma reforma ampla das áreas
internas do BC — e não cuida mais dos processos punitivos, que
passou a ser responsabilidade da diretoria de Organização do
Sistema Financeiro. Com isso, o departamento pode se concentrar
somente na fiscalização e no monitoramento do sistema, sendo
responsável apenas pela instalação dos processos punitivos, avalia
Meirelles.

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