A SPM lamenta que, às vésperas da
Lei Maria da Penha completar quatro
anos de existência, o Brasil esteja presenciando casos de tamanha
crueldade e violência como o de Eliza Samudio e Mércia Nakashima.
Também é triste constatar a não aplicação desta Lei por parte de seus
operadores, uma vez que foi criada especificamente para proteger as
mulheres vítimas da violência doméstica.
No caso específico de Eliza Samudio, o 3º Juizado de Violência
Doméstica do RJ negou o pedido de proteção a Eliza em outubro de 2009,
por considerar que a jovem não mantinha relações afetivas com o goleiro
Bruno Fernandes. Na ocasião, a Delegacia de Atendimento à Mulher de
Jacarepaguá (DEAM) pediu à Justiça que o atleta fosse mantido longe da
vitima, já que Bruno cometeu os crimes de agressão, e de cárcere
privado, alem de ter dado substâncias abortivas.
A juíza ti tular do 3º Juizado, Ana Paula Delduque Migueis Laviola de
Freitas, explicou em sua decisão que Eliza não poderia se beneficiar
das medidas protetivas, nem “tentar punir o agressor”, sob pena de
banalizar a Lei Maria da Penha. A magistrada entendeu que a finalidade
da legislação é proteger a família, seja proveniente de união estável
ou de casamento e não de uma relação puramente de caráter eventual e
sexual.
O artigo 5°, inciso III da Lei Maria da Penha caracteriza como
violência doméstica “qualquer relação íntima de afeto, na qual o
agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independente de
coabitação”. A legislação não estipula o tempo da relação, porque a
violência doméstica e familiar contra a mulher se configura por meio de
qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico, além de dano moral ou
patrimonial. Qualquer relacionamento amoroso, portanto, pode terminar
em processo judicial com aplicação da Lei Maria da Penha, se envolver
violência doméstica e familiar contra a mulher e violar os direitos
humanos.
Neste episódio, Eliza procurou proteção do Estado porque sofreu
ameaças, lesões, cárcere privado e indução ao aborto. Apesar de sua
integridade física e a da criança estar em perigo, seu apelo não foi
atendido.
Para a Secretaria de Políticas para Mulheres, a alegação de que Eliza
não precisava de proteção do Estado porque era apenas uma “amante” ou
“ficante”, remete aos padrões antigos de preconceito contra as
mulheres. Além disso, questiona a honestidade da vítima, que declarou
que a relação não foi apenas de uma noite. O casal se encontrava com
freqüência e se falava por telefone. No entanto, após saber que Eliza
estava grávida e que ele era o pai da criança, o goleiro terminou o
relacionamento.
Não bastarão leis para proteger as mulheres se as suas vozes não forem
ouvidas e se houver omissão do Estado. A omissão e desídia dos agentes
são defeitos que maculam a atividade pública. O Estado tem de ser
responsabilizado pelas suas ações, para evitar que mais mulheres sejam
brutalmente assassinadas após buscar amparo e proteção legal. Este não
é o primeiro caso – recordemos o caso Maria Islaine, Mércia, e outras
tantas Marias e Eloás do nosso País.