Comunidades indígenas
de todo o país entregaram nesta terça-feira (19) ao ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo, e também ao Senado, uma carta com
reivindicações e críticas à política indígena. No documento,
que será entregue à presidente Dilma Rousseff, os índios pedem,
entre outros pontos, celeridade na aplicação de ações que
assegurem seus direitos e que seja respeitado seu direito de
participar e opinar sobre assuntos que os afetem, como a implantação
de grandes empreendimentos em reservas indígenas. Como exemplo, os
índios citam a construção das hidrelétricas Belo Monte e Jirau.
No documento,
entregue no Senado pela índia Claudeci da Silva Braz, representante
da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), as
comunidades criticam a política indígena desenvolvida nos oito anos
de mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pedem mais
participação nas decisões da Fundação Nacional do Índio
(Funai).
“O Estado brasileiro,
durante o mandado do governo Lula, não atendeu a contento as
demandas e perspectivas do movimento indígena. Permitindo que as
políticas voltadas aos nossos povos continuem precárias ou nulas,
ameaçando a nossa continuidade física e cultural”, diz trecho da
carta. “Queríamos neste dia estar comemorando nossas conquistas,
mas não estamos”.
Tratamento
diferenciado
O senador Wellington Dias (PT-PI),
ex-governador do Piauí e descendente de índios, defendeu tratamento
diferenciado para os índios no país. “Índio não é peça de
museu. O Brasil precisa reconhecer que os índios no país são
capazes de decidir os seus caminhos. O país não pode tratar seus
índios da forma como eles estão sendo tratados hoje. Não estamos
no caminho certo”, afirmou.
Alvo de críticas dos índios, o
ouvidor da Funai, Paulo Celso Oliveira, afirmou à Agência Brasil
que a fundação tem buscado o diálogo com os povos indígenas, mas
reconheceu também que há problemas na estrutura do órgão. “A
Funai tem trabalhado para ampliar o diálogo com os povos indígenas.
Inclusive, no governo do presidente Lula, foi criada a Comissão
Nacional de Política Indigenista que, no momento, faz parte de um
projeto de lei que tramita no Congresso [Nacional] para que seja
transformada em um Conselho Nacional de Política Indigenista”,
argumentou.
A criação do conselho, aliás, também é tema
da carta enviada às autoridades. O órgão deverá ser uma instância
deliberativa, normativa e articuladora de todas as políticas e ações
ligadas aos povos indígenas. A alegação é que a causa indígena
“está dispersa em diversos órgãos do governo”. Os índios
querem também que o governo crie uma Política Nacional de Gestão
Ambiental e Territorial de Terras Indígenas, para assegurar a
sustentabilidade e proteção de seus territórios.
Distantes
do Estado
Segundo o ouvidor da Funai, os povos indígenas
estiveram por muito tempo distantes do Estado e essa seria a
motivação das reclamações dos índios. “A Funai está aberta a
ouvir todas as lideranças, como tem ouvido as várias delegações
de todo o país. Nesse processo, está disposta a fazer os ajustes
necessários e a Funai segue a Constituição, ouvindo a todos”,
disse Oliveira.
“Historicamente, há uma limitação. Mas se
considerarmos que, antes da atual Constituição de 1988, tínhamos
uma realidade indígena mais difícil e que essa realidade vem
melhorando, podemos dizer que estamos caminhando para uma situação
de melhor qualidade de vida para os povos indígenas, apesar dos seus
problemas”, argumentou o ouvidor da Funai.
O tema que abre a
carta é a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas, que tramita
há 20 anos no Congresso. O ministro da Justiça afirmou que vai
procurar a Casa Civil da Presidência da República para verificar se
o texto que tramita no Parlamento precisa de alguma alteração.
Cardozo pediu a mobilização dos povos indígenas em torno do
assunto, alegando que “muitos interesses contrários se movimentam
no Congresso em torno da proposta”, o que envolve, segundo ele, 50%
de seus itens.
Prioridades
As comunidades
indígenas pedem a regularização de suas terras e citaram, na
carta, como prioridades nesse quesito, as comunidades de Mato Grosso
do Sul, principalmente dos Guarani-Kaiowá; dos povos indígenas do
sul e extremo sul da Bahia; do Sul do país, especialmente os povos
Xetá e Tembé; e a Terra Indígena Guamá, no estado do Pará. Os
índios defendem sua permanência nas áreas de proteção permanente
sob alegação de que essa forma de ocupação tradicional “não
conflita com a figura jurídica” em questão.
Outra
reivindicação é o fim de hostilidades que os índios alegam estar
sofrendo ao exercitarem seu direito à proteção, assegurado por
lei. Eles se sentem “criminalizados por agentes do Poder Público
que deveriam exatamente exercer a função de proteger e zelar”
por eles. Os índios também pedem que o governo garanta sua proteção
nas áreas de fronteira.