“Qual
seria a idade mínima num país-continente como este, onde o
homem-gabiru nordestino ou o trabalhador do setor usineiro vive até
os 60 anos, e o do interior gaúcho, em média, até os 80?”
O
questionamento, do presidente da Associação Nacional dos Auditores
Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), Vilson Antonio Romero,
é a mesma preocupação de setores representativos da sociedade –
entre eles o movimento sindical – com a possibilidade, aventada
pelo governo federal, de se estabelecer uma idade mínima para a
aposentadoria no Brasil. “Haveria uma regra de transição?”,
continua Romero, reforçando que qualquer decisão nesse sentido será
injusta com a maioria da população.
A
Central Única dos Trabalhadores (CUT) divulgou nota, na sexta-feira
8, por meio da qual afirma que o governo “erra ao propor uma
reforma na Previdência, porque esse não é o desejo da classe
trabalhadora”.
“Antes
de mudar a idade mínima para a aposentadoria, temos de corrigir
outras injustiças” sugere a presidenta do Sindicato, Juvandia
Moreira. “Nós sabemos que a Previdência precisa de recursos, mas
esse dinheiro pode ser cobrado dos sonegadores, que remeteram R$ 500
bilhões ao exterior sem pagar impostos só em 2014.”
“Por
que o Governo Federal não cobra da Globo, por exemplo, que tem
processo na Receita Federal por sonegação de R$ 1,5 bilhão? Ou do
HSBC, cujos correntistas remeteram recursos para o exterior? Ou das
empresas que são investigados por suspeita de negociar ou pagar
propina para extinguir débitos com a Receita Federal no Conselho
Administrativo de Recursos Federais?”, questiona a Juvandia, que
propõe também taxar grandes fortunas.
Desnecessário
– De
acordo com o Ministério do Trabalho e da Previdência Social, o INSS
paga mensalmente 32,6 milhões de benefícios. Desses, somente 5,4
milhões são aposentadorias por tempo de contribuição, que
representam cerca de 17% do total. E seria apenas sobre esse grupo
que incidiria a mudança na idade mínima, explica o vice-presidente
da Associação Nacional dos Participantes dos Fundos de Pensão
(Anapar) e especialista em Previdência, José Ricardo Sasseron. “Por
isso não existe necessidade de se estabelecer idade mínima. O
governo está enganado quando se trata deste assunto”,
afirma.
Sasseron
ressalta que recentemente foi aprovada a lei que estabelece a fórmula
85/95 para que a pessoa possa se aposentar sem os redutores previstos
pelo fator previdenciário. Os números 85 e 95 significam a soma da
idade da pessoa e seu tempo de contribuição para o INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social) – 85 é para mulheres e 95 para homens.
Por exemplo, se uma mulher tem 55 anos de idade e 30 anos de
contribuição, ela pode se aposentar porque a soma dos dois valores
dá 85 (55 + 30). No caso de um homem, ele poderia se aposentar se
tivesse, por exemplo, 60 anos de idade e 35 anos de contribuição
(60 + 35 = 95). E vai ficando mais rígida ao longo dos próximos
anos, até chegar ao patamar de 90/100.
“Com
isso, a tendência é que muita gente se aposente mais tarde para
receber o benefício sem influência do fator previdenciário, que
representa descontos no valor da aposentadoria”, explica o
especialista.
Rombo?
– Romero,
da Anfip, acrescenta que é fundamental haver transparência na
divulgação das contas para se conhecer as razões do rombo na
Previdência que motivaram o governo a querer alterar as regras para
aposentadoria. “Do dinheiro do INSS são retirados anualmente cerca
de R$ 30 bilhões ou mais para incentivar diversos setores da
economia, por meio das renúncias previdenciárias [empresas que
pagam alíquotas menores ou estão isentas] voltadas para as áreas
da filantropia – educação e saúde, agronegócio, micro e pequena
empresa, entre outras”, completa o presidente da Anfip.
Ele
também avalia que para que as contas se equilibrem, tem de ser
encontrada uma forma mais equânime para o financiamento das
aposentadorias do setor rural, que dispendem mais de R$ 80 bilhões
ao ano, frente a uma arrecadação de cerca de R$ 6 bilhões (dados
de 2014).
Sasseron
lembra que a seguridade social brasileira – que engloba saúde,
Previdência e assistência social – é superavitária.
“Atualmente, cerca de 30% do mercado de trabalho ainda atua na
informalidade, ou seja, não recolhem impostos para custear a
Previdência. Se a fiscalização governamental for mais efetiva e
todos se formalizarem, ainda melhora um pouco esse balanço da
seguridade social brasileira.”