Estudos feitos no Brasil, Uruguai e Paraguai indicam que políticas
públicas de combate à pobreza são insuficientes para melhorar as
condições de trabalho de mulheres na América Latina. Os dados mostram
que a falta de atenção à divisão dos horários de trabalho por sexo nas
famílias perpetua a dupla jornada feminina ou o excesso de dedicação a
atividades não remuneradas.
As pesquisas foram apresentadas nesta segunda-feira (3) durante o
seminário Do Combate à Pobreza às Políticas Públicas de Igualdades: um
Debate Pendente, organizado pelo Centro Feminista de Estudos e
Assessoria (Cfemea). O levantamento brasileiro aponta que, em 2011, as
mulheres colaboraram com 27 horas semanais em serviços domésticos,
enquanto os homens dedicaram 11 horas, segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No Uruguai, as jovens de classe mais baixa dedicam pelo menos seis horas
a mais por dia a atividades sem remuneração, do que homens da mesma
faixa etária e classe social. Segundo dados de 2008 do Instituto
Nacional de Estatística, do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas
para a Mulher e da Universidad de la Republica, as mães de crianças com
até 6 anos dedicam uma média de 57 horas semanais a atividades não
remuneradas.
Já no Paraguai, em 2012, enquanto a taxa de desemprego masculina é de
4,4%, a feminina chega a 7,4%. Entre os jovens de 18 a 24 anos, o índice
é de 12,6% para homens e 16,9% para mulheres. Junto aos menores níveis
de renda de acordo com a atividade econômica, 45,2% das mulheres não têm
renda própria, enquanto os homens sem renda somam 13,8%. No setor
rural, o número de paraguaias sem renda alcança 61,1%.
Para a coordenadora do Cfemea, Nina Madsen, apesar dos avanços no acesso
das mulheres ao mercado de trabalho, elas ainda são as mais
prejudicadas quando o assunto é pobreza. “O enfrentamento da pobreza não
vai ser eficiente e sustentável se não começar a olhar para as mulheres
e para a diversidade da população pobre, considerando as desigualdades.
A pobreza não pode ser só insuficiência de renda e não pode ser
solucionada a partir desse paradigma. Ela precisa ser entendida como um
conjunto muito mais amplo de insuficiências”, explicou.
Segundo Nina, o cenário é semelhante não apenas no Brasil, Uruguai e
Paraguai, mas em toda a América Latina, já que a divisão sexual do
trabalho é estruturante das sociedades ocidentais como um todo. “No
Brasil, essas políticas têm uma amplitude muito grande. Há um volume
imenso de recursos. A política de enfrentamento à pobreza e o Programa
Bolsa Família, em particular, são realmente muito poderosos, se você
coloca em um panorama regional.”
Para a coordenadora do Instituto Feminista para a Democracia (SOS
Corpo), Maria Betânia Ávila, políticas de combate à pobreza são
fundamentais, mas precisam estar associadas a políticas de qualificação
social e de proteção social. Essas causas, de acordo com a especialista,
são capazes de influenciar na diminuição da pobreza e também na
estruturação de qualidade de vida para a população, por se tratarem de
medidas estruturais.
“Nesses programas, as mulheres ainda aparecem como centro das políticas,
no sentido de que as políticas ainda se apoiam nelas como mães, como
sustentadoras da vida cotidiana. Isso é uma contradição, um paradoxo”,
disse. “As crianças e os jovens precisam de políticas que garantam seu
futuro, mas as mulheres precisam também de políticas que as considerem
como indivíduos, como cidadãs, para construírem suas possibilidades de
vida, sua realização no presente e sua proteção social no futuro”,
completou.