Os programas de proteção social não são o fator principal para a redução
das desigualdades no Brasil, que tem sido mais influenciada pelo
aumento da renda do trabalho. Programas de transferência de renda como
Bolsa Família e Brasil Carinhoso, no entanto, têm ajudado o país a
garantir um crescimento econômico com mais qualidade, segundo avaliou
nesta segunda-feira (3) o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), Marcelo Neri.
“Podemos invejar as taxas de crescimento de outros países do Brics
[grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul], mas o
Brasil optou por um crescimento com mais qualidade. Não se trata de um
crescimento espetacular, mas é inclusivo, sustentável e percebido pelas
pessoas”, disse o economista, ao participar de um encontro internacional
sobre o desenvolvimento de programas de proteção social, em Brasília.
O seminário Recentes Desenvolvimentos no Papel e no Design de Programas
de Proteção Social é organizado pelo Centro Internacional de Políticas
para o Crescimento Inclusivo (CIP-CI) do Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento (Pnud). Durante o encontro, que vai até quarta-feira
(5), pesquisadores, acadêmicos e especialistas da América Latina, Ásia e
África discutem desafios e inovações das políticas sociais em países
emergentes.
Para Neri, o modelo brasileiro, pautado na expansão da renda proveniente
do trabalho associada ao desenvolvimento de políticas sociais,
representa uma opção acertada, por se basear na diversificação das
fontes de crescimento. “Assim, não se colocam todos os ovos na mesma
cesta, e os programas de transferência de renda podem ser diminuídos no
futuro sem vulnerabilizar a população”, explicou.
Ele também destacou a parceria entre governos federal, estaduais e
municipais como elemento capaz de otimizar os resultados dos programas
de transferência de renda, garantindo mais eficiência à aplicação dos
recursos. Neri enfatizou, no entanto, que essa complementaridade nas
ações das três esferas governamentais precisas ser intensificadas nos
estados mais pobres do Norte e Nordeste.
“[Essas parcerias] são importantes porque permitem a criação de
programas complementares, voltados às necessidades locais. Já vemos isso
em 12 estados, mas nenhum deles está nessas regiões, em que
tradicionalmente há muitos pobres e poucos recursos”, disse.
Ainda durante o seminário, a diretora de Programas da Secretaria de
Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Diana Grosner,
enfatizou o papel dos programas de transferência de renda no aumento da
classe média brasileira nos últimos anos. Segundo ela, em 2002, a classe
média representava 38% da população brasileira, e a expectativa é que,
ao fim deste ano, alcance 53% da população.
“Esse crescimento, felizmente, é explicado pelo movimento de pessoas que
ascenderam das classes mais pobres e não porque pessoas que estavam nas
classes mais altas caíram para a classe média”, disse.
Diana Grosner atribui o quadro positivo à busca ativa implementada pelos
programas brasileiros, segundo a qual o “Estado vai atrás do
extremamente pobre para inclui-lo”. Com isso, a eficácia da inclusão
social aumentou. “Mais importante do que um programa universal é um
programa bem focalizado, para garantir a redução da extrema pobreza”,
ressaltou.
Ela lembrou que, diferentemente da Índia, a inclusão de brasileiros na
classe média ocorre também entre a população rural, com a contribuição
de ações como as do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (Pronaf), que prevê financiamento de projetos que gerem renda
aos agricultores familiares.
Professor do Instituto Indira Gandhi de Pesquisa sobre o
Desenvolvimento, o economista indiano Rayaprolu Nagaraj, ressaltou que a
experiência latino-americana pode ajudar a Índia a vencer seus maiores
desafios em proteção social: melhorar a distribuição de renda e combater
a extrema pobreza que ainda assola boa parte da população,
principalmente a rural.
Ele ressaltou, no entanto, que a falta de um mercado interno robusto
pode atrapalhar os resultados de políticas de transferência de renda nos
moldes brasileiros. “Com a falta ou a ineficiência de mercados, o que
as pessoas vão fazer com o dinheiro que vão receber?”, questionou.
Nagaraj lembrou que a economia do país, que foi colônia britânica até
1950, está sendo impulsionada nos últimos anos pela expansão do setor de
tecnologia da informação e pelo aumento das exportações de serviços,
mas continua atrelada à agricultura, “com crescimento polarizado e com
fortes desigualdades sociais”, acrescentou.