Em meio a uma crise de representatividade do setor, a Federação
Brasileira de Bancos (Febraban) passará em breve por uma reestruturação.
A mudança acontece pouco menos de dois anos depois de os bancos terem
optado pela profissionalização da entidade, com a chegada de Murilo
Portugal à presidência.
Desde meados deste ano, a consultoria Ernst & Young está encarregada da reformulação da entidade, segundo o
Valor apurou,
em um projeto liderado por Portugal, primeiro presidente da Febraban
desde o fim do tradicional sistema de rodízio entre banqueiros.
Procurada pela reportagem, a Febraban não comentou o assunto.
Com a imagem dos bancos bastante desgastada perante a população,
principalmente em meio à cruzada iniciada pela presidente Dilma
Rousseff, primeiro contra os altos juros bancários e, depois, contra as
tarifas, a Febraban quer passar a ser mais pró-ativa em relação aos
problemas do setor.
Em vez de só rebater críticas e tentar se defender, a entidade deve
começar a trabalhar para solucionar alguns problemas do sistema antes
que eles se tornem um caso de governo. “É até uma questão de demonstrar
boa vontade”, diz um banqueiro envolvido no projeto.
Para fazer isso, o diagnóstico da Ernst & Young é que a Febraban
deve se dedicar a menos assuntos, mas com o objetivo de concentrar os
esforços em resolvê-los. Hoje existem mais de 30 comitês dentro da
entidade, sem que exista, por exemplo, nenhuma hierarquia entre eles. A
entidade também se dedica à montagem de inúmeros cursos que, na
avaliação de alguns banqueiros, poderiam ser contratados com terceiros.
Dentro dessa nova configuração, um dos temas que deve ganhar mais corpo
na entidade é a autorregulação do setor bancário. A ideia é criar uma
estrutura que tenha um papel semelhante ao desempenhado atualmente pela
Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de
Capitais (Anbima), responsável pela autorregulação de ofertas públicas e
de fundos de investimento.
Outro ponto central do projeto é o fortalecimento do quadro de pessoas
técnicas. A Febraban tem hoje cerca de cem funcionários próprios e
depende de cerca de 2.500 voluntários dos bancos associados. É uma
equipe pequena quando comparada a outras entidades. Na Anbima, existem
336 funcionários próprios.
Com um quadro técnico mais robusto, avalia-se que a Febraban poderia,
por exemplo, responder mais prontamente – e com mais propriedade – aos
questionamentos recebidos de fora. Na avaliação de um banqueiro, isso
teria tornado a recente queda de braço com o governo, por exemplo, menos
traumática.
Os bancos estão agora na fase final de discussão do projeto. A
expectativa é que já no início do ano que vem a Febraban possa dar
início à reforma. O principal ponto de debate neste momento gira em
torno do novo orçamento da entidade.
Apesar de o projeto prever que a Febraban passará a se dedicar a menos
assuntos, o fortalecimento das áreas técnicas a tornaria mais custosa
aos associados. É algo que não tem agradado as instituições financeiras,
sendo motivo de novas rodadas de negociações entre os executivos.
Essa não é a primeira vez que a Febraban passa por uma reformulação.
Além da profissionalização que ocorreu no ano passado, em 2006, uma
consultoria externa foi contratada para reformar a entidade. Segundo o
Valor apurou, porém, as mudanças que devem acontecer em breve terão uma dimensão muito maior que as anteriores.
Agora, a reformulação também se dá em um momento considerado pelos
próprios banqueiros como bastante delicado para a Febraban. Fundada em
1967, a entidade sempre foi reconhecida como uma das federações mais
fortes do país. Depois, porém, de uma tentativa desastrosa de negociação
entre Portugal e a área econômica do governo em torno da redução dos
spreads bancários em abril deste ano, a Febraban perdeu espaço como
interlocutora perante as autoridades.
Hoje, a maior parte das discussões com o governo é feita diretamente
pelos banqueiros. “Minha sensação é que a Febraban perdeu a
legitimidade”, afirma um banqueiro que faz parte da diretoria da
associação.
Não são poucas as vezes, por exemplo, em que a Febraban, sem saber,
inicia um debate que já foi começado de forma individual por algum
banco. Esse diálogo direto tem se tornado mais fácil até pela própria
concentração bancária, que está no auge dos últimos dez anos, como
mostram dados do Banco Central.
Mesmo com os atritos, dois bancos ouvidos pelo
Valor negam a possibilidade de que o comando da Febraban possa ser mudado agora. O contrato de Portugal tem duração de três anos.