Esperada por diversos movimentos sociais, a Política Nacional de
Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) foi instituída pelo decreto
7.794 no dia 21 de agosto. Prevista para sair em junho, durante a Cúpula
dos Povos, sua publicação foi adiada por quase três meses e avaliada
como tímida.
Com o objetivo de integrar, articular e adequar
políticas, programas e ações da produção agroecológica e orgânica, a
política tem como diretrizes a promoção da soberania e segurança
alimentar e nutricional, do uso sustentável dos recursos naturais, a
conservação dos ecossistemas naturais e recomposição dos ecossistemas
modificados, a valorização da agrobiodiversidade e dos produtos da
sociobiodiversidade e estímulo às experiências locais, além das questões
da participação da juventude e da redução das desigualdades de gênero.
No
entanto, questões consideradas fundamentais para a Articulação Nacional
de Agroecologia (ANA), o Conselho Nacional de Segurança Alimentar
(Consea) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) foram
deixados de lado como, por exemplo, o plano de redução de uso de
agrotóxico no Brasil com banimento das substâncias já proibidas em
diversos países, a definição de áreas contínuas de produção
agroecológica, além de apoio à pesquisa e assistência técnica deste
modelo. “Propomos um programa específico para as mulheres, uma vez que
elas têm um papel fundamental na transição agroecológica, mas a política
trouxe uma abordagem muito sutil. É preciso reconhecer o papel das
mulheres que hoje ainda são vistas apenas como apoio nestas atividades”,
acrescenta a presidente do Consea, Maria Emilia Pacheco.
Alguns
movimentos sociais também apresentaram seu ponto de vista sobre a PNAPO.
Em moção publicada durante o I Encontro Unitário dos Trabalhadores,
Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas: por Terra,
Território e Dignidade realizado em agosto, a função social da terra e a
promoção do acesso à água como um bem de domínio público são lembradas
como reivindicações não contempladas pela política. Segundo o documento,
a participação da sociedade também foi restringida. “Tivemos duas
grandes decepções em relação à questão da participação da sociedade
civil, a primeira delas é que a política define a criação de uma
comissão e não a de um conselho, como nós havíamos solicitado. Além
disso, na sua composição, ela foi definida como paritária, enquanto
apostávamos na composição de 2/3, assim como é constituído o Consea e
que temos experiências muito positivas”, explica Maria Emilia.
Ganhos – A
Parte 1 do Dossiê da Abrasco – Agrotóxicos, Segurança Alimentar e Saúde
lançado em abril no World Nutrition Rio 2012 indicava para a criação de
uma política de agroecologia como uma forma de promoção da saúde. “Pelo
olhar da saúde coletiva, a gente percebe que o nosso modelo
agroecológico pode evitar algumas causas dos problemas de contaminação
por agrotóxico, por exemplo, que está associado ao modelo de agricultura
quimificado, baseado na revolução verde. A agroecologia é uma proposta
de alteração do modelo, então, pela primeira vez, a gente começa a ver
aparecer políticas que sinalizam e apontam nesta direção”, comentou
Fernando Carneiro, da Abrasco.
Maria Emilia lembra ainda que as
diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
também apontavam para a implantação de sistemas sustentáveis de base
agroecológica. “A produção da agroecologia inclui também a produção de
hábitos alimentares com características mais regionais, portanto, mais
saudáveis, permitindo a sustentabilidade dos sistemas alimentares”,
explicou.
Ela ainda ressalta que uma dos destaques positivos
desta política é encontrado no artigo 12, no qual propõe alterações
sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas – SNSM, aprovado pelo
Decreto nº 5.153, em relação à dispensa de inscrição no Registro
Nacional de Sementes e Mudas (RENASEM), facilitando assim a
multiplicação de sementes ou mudas para distribuição, troca e
comercialização em diferentes estados. “É fundamental ter um programa de
conservação da biodiversidade, e podemos ver pouco deste reconhecimento
nesta parte da política, que reconhece existência da semente crioula e
nativa. Antes víamos um restrição do direito dos agricultores, que,
agora, está tendo mais flexibilidade, incentivando assim esta produção e
comercialização”, analisa.
Próximos passos – De
acordo com Fernando Carneiro, da Abrasco, é preciso agora criar a
Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO) para que
os objetivos da política passem a se concretizar. “Sem dúvida esta
política é uma conquista dos movimentos que, ao longo de anos, vêm
pensando e propondo questões, mas ela precisa da criação de Comissão
urgente para que a política não se reduza a apenas uma carta de
intenções”, analisa. Caberá à Comissão Nacional de Agroecologia e
Produção Orgânica (CNAPO), dentre outras competências, a elaboração e o
acompanhamento da PNAPO e do Plano Nacional de Agroecologia e Produção
Orgânica (PLANAPO), além de propor diretrizes, objetivos e prioridades
do plano ao Poder Executivo Federal.
A definição das prioridades
também é apontada pela representante do Consea como um dos primeiros
passos a serem tomados. “Quando nós fizemos e encaminhamos sugestões à
política, estas vinham acompanhadas de medidas prioritárias que não
foram acatadas. Agora essas prioridades devem ser definidas o quanto
antes para que possamos negociar com o governo e começar a concretizar a
elaboração do PLANAPO que o decreto prevê”, aponta a representante do
Consea. Ela explica ainda que para instituir a Comissão Nacional de
Agroecologia e Produção Orgânica é preciso pressionar o governo para a
criação de uma portaria que a regulamente. Para tal, a ANA e o CONSEA já
estão em articulação e com audiências previstas com o Ministro do
Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas e com ministro-chefe da
Secretaria-Geral da Presidência da República do Brasil, Gilberto de
Carvalho para as próximas semanas.