Diversas entidades de direitos humanos pernambucanas irão ao
Ministério Público de Pernambuco nesta quarta-feira (5 de setembro) para
entregar uma representação contra o Instituto Pró-Vida e a Folha de
Pernambuco. A entidade auto-denominada cristã publicou no jornal, nesta
segunda-feira, um anúncio de rodapé em que comparava a homossexualidade
(por eles chamada de ‘homossexualismo’) e a prostituição à pedofilia e à
violência sexual contra crianças. Completava com o slogan “Pernambuco
não te quer”, em referência ao mote “Recife te quer”, utilizado pela
propaganda oficial da secretaria de Turismo do município.
“A liberdade de expressão é um princípio constitucional, não um
direito absoluto. Quando dispõe-se a falar o que quiser, o sujeito tem
que estar disposto a responder pelo que diz. Nesse caso específico, são
co-responsáveis. O jornal tem a prerrogativa de negar anúncios se achar
que não condizem com a política da empresa “, informa Ivan Moraes Filho,
do Centro de Cultura Luiz Freire. “Vale lembrar que o termo
“homossexualismo” foi extinguido na década de 80, quando a Organização
Mundial da Saúde deixou de considerar uma patologia o desejo pelo mesmo
sexo. Também a prostituição de homens e mulheres adultos, no Brasil, não
é crime. Ou seja: compará-la com a exploração a crianças ou a pedofilia
é um ato de preconceito absurdo”
A publicação teve uma grande repercussão nas redes sociais durante
toda esta terça-feira (5/09), sendo reproduzida por diversos sites e
blogs em todo o Brasil. No Facebook e no twitter, choveram críticas à
instituição que assina a campanha e à empresa de comunicação que
permitiu a publicação. “A Folha consegue ser tão ridícula quanto o
Pró-Vida, se não pior. Ganha dinheiro vendendo espaço no jornal pra uma
propagação de ódio, ou seja, recebeu pra promover um crime”, escreveu a
publicitária Mele Dornelas em seu microblog. Fernando Oliveira, também
no twitter, corroborou: “O jornal incentiva a propagação do ódio por
meros trocados. Faltou compromisso com o leitor.”
A própria prefeitura da cidade do Recife também não gostou de ver seu
slogan transformado em nome da homofobia. Em nota, a secretaria de
Turismo afirmou que “o posicionamento homofóbico da instituição
responsável pelo anúncio não reflete a realidade vivenciada pelos
turistas que nos visitam. (…) deixamos um recado para todas as cores,
religiões, opções e diversidades: o Recife te quer sempre!”
O barulho foi tanto que a empresa responsável pelo periódico tentou
redmir-se utilizando também a internet. Primeiro com tweets em que dizia
que o anúncio “autorizado e pago pelo Instituto Pró Vida PE não reflete
a opinião do jornal”. Algumas horas depois, com
uma nota publicada em seu blog, a Folha de Pernambuco pediu desculpas e
afirmou tratar-se de um “erro que não mais se repetirá”. Disse
também que “ao longo dos seus 14 anos, construiu um histórico de
respeito aos seus leitores, focado na promoção aos direitos humanos,
inclusive da comunidade LGBT”.
A resposta da empresa de comunicação não foi considerada satisfatória
pelos ativistas que se reunirão no Ministério Público. “Não basta um
pedido de desculpas num blog ou no twitter. É preciso que o jornal
assuma seu erro também nas páginas impressas, chamando a mesma atenção
que foi chamada pelo anúncio homofóbico”, afirma Jô Meneses, da ONG
Gestos. Para Patrícia Carvalho, uma das organizadoras da Marcha das
Vadias, a resposta pode vir do setor de jornalismo. “Eu quero mesmo que
eles façam um caderno inteiro defendendo a diversidade, talvez assim eu
fique mais mansa com eles”, brincou – séria.
Para Ivan Moraes Filho, é preciso reconhecer que os jornalistas da
Folha não são responsáveis pela publicidade. Mas o jornal é. “O conteúdo
do jornal é o conjunto de suas matérias e seus anúncios e a empresa é
responsável pelos dois, afinal de contas, o produto que ela ‘vende’ é
sua credibilidade. Ou seja: a empresa deseja que os leitores acreditem
também nos anúncios que publica”.
O presidente do Pró-Vida PE, Márcio Borba, não pareceu preocupar-se
com a má recepção de seu anúncio. “A Constituição permite o direito à
liberdade de expressão, pensamento, culto, religião e opinião”, afirmou
ao blog Hall Social
e mostrando desconhecimento sobre a legislação vigente sobre difamação,
além da lei municipal contra a homofobia, que data de 2004 e que prevê
multas para atitudes semelhantes a esta.
Conivência – Ao contrário do que alguém possa
imaginar, os jornais não são obrigados a publicar anúncios que não achem
condizente com as políticas da empresa. O recurso de se negar a
publicação de anúncios muitas vezes é utilizado quando periódicos
preferem não envolver-se em litígios ou quando acreditam que os
conteúdos podem trazer problemas legais para a empresa. “Se o anúncio
fosse ofensivo a outro grupo social, digamos, os judeus, será que
publicariam?”, questiona o jornalista e cientista social Rafael Fortes.
Recentemente, o Sindicato dos Servidores do Ministério Público de
Pernambuco teve a publicação de uma nota pública negada pelo Diario de
Pernambuco. Para o mesmo texto, a Folha de Pernambuco utilizou de outro
expediente para deixá-lo de fora. Demorou seis horas para definir o
orçamento e acabou pedindo R$ 25 mil para colocá-lo em seu jornal de
domingo em um quarto de página, inviabilizando a publicação. Para se ter
uma ideia do sobrepreço, a nota acabou publicada no Jornal do
Commercio, no mesmo dia, por R$ 9 mil.