Economista Fernando Nogueira da Costa lança livro “Brasil dos bancos”

Bancos do Brasil ou Brasil dos bancos? A internacionalização recente
pode conter parte relevante da resposta à questão que Nogueira da Costa
propôs a si mesmo.


Fernando Nogueira da Costa dedica-se a estudar os bancos brasileiros há
34 anos. Sua dissertação de mestrado, defendida em 1978, já tinha por
objeto de estudo os bancos privados de Minas Gerais. Quem orientou a
tese foi a então professora de mestrado da Unicamp Maria da Conceição
Tavares.


E é Conceição quem apresenta seu ex-aluno nas orelhas do livro. Ficamos
sabendo por ela que, no início dos anos 2000, Costa “tornou-se um
militante ativo na desmistificação do neoliberalismo e na defesa dos
bancos públicos”. Embora tenha mais de 500 páginas, “Brasil dos Bancos” é
apenas a síntese das pesquisas de Costa sobre a área bancária.


O que detonou seu interesse pelos bancos foi o gatilho da perplexidade
desencadeada por uma contradição: os bancos mineiros, sediados em uma
economia mais frágil, eram então os maiores bancos privados do Brasil.
Nos anos 1980, novo desafio: a crise dos bancos estaduais e o
incandescente debate em torno de sua privatização.


O caso Banespa forneceu vasto material à sua tese de doutorado, em 1988.
O trabalho que havia começado na sala de aula em 1976 não parou nunca,
avança pelos dias atuais, já que o setor bancário mantém-se em
permanente ebulição.


Na primeira metade dos anos 1990, Costa pesquisou a diversificação
setorial dos grandes grupos bancários privados nacionais. Na segunda
metade, estudou a crise e a quebra de grandes bancos, as privatizações
dos estaduais, a concentração e a desnacionalização bancária. E, neste
século, dedicou-se a defender as instituições federais das ameaças de
privatização.


Costa não se refugia no conforto da redoma acadêmica: entre 2003 e 2007,
ocupou a vice-presidência de finanças e mercado de capitais da Caixa
Econômica Federal, ao mesmo tempo em que atuava como diretor-executivo
da Febraban.


O livro não é de historiador, mas de economista: ao mesmo tempo em que
estuda a genealogia e a trajetória dos bancos de maior relevância, busca
nas experiências passadas luzes para compreender os acontecimentos
atuais, para poder, assim, imaginar o futuro. Está dividido em três
grandes partes.


A primeira analisa o papel do Estado na constituição do sistema
financeiro nacional, descreve a atuação do Banco do Brasil e da Caixa
Econômica Federal e explica o ciclo histórico dos bancos estaduais de
São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, de suas origens até a
privatização.


A segunda parte trata dos bancos privados. Reconstitui a história das
joias da coroa bancária nacional: Real (hoje Santander), Bradesco, Itaú,
Unibanco e Safra. E também do fracasso dos antigos impérios Econômico,
Nacional e Bamerindus. Trata, nesta seção, da desnacionalização do
varejo bancário brasileiro.


Na terceira parte, o foco ganha um viés mais macroeconômico, ao
consolidar a trajetória dos bancos com a própria história monetária do
país. É nessa parte que Costa aborda os grandes temas da atualidade: o
acesso da população aos bancos, a evolução tecnológica, as novas formas
de manutenção da riqueza, a evolução do crédito e a formação da taxa de
juros dos empréstimos.


Depois de esmiuçada toda a história dos bancos brasileiros, Costa se
ocupa dos impactos da crise global deflagrada em 2008 sobre o sistema
bancário do país. O colapso de Wall Street secou o crédito mundial e o
brasileiro. Mas os seus efeitos foram ainda mais perversos sobre as
pequenas e médias instituições, já abaladas, quatro anos antes, pela
bancarrota do Banco Santos.


Restaram a elas poucas opções para obtenção de “funding”: vender as
carteiras de crédito, sobretudo de consignados, para antecipar liquidez;
colocar no mercado de capitais fundos de investimentos em direitos
creditórios (FIDCs), formados pelos recebíveis que conseguiam arrumar;
captar recursos no exterior e abrir o capital na Bolsa. A venda das
carteiras aumentou a concentração do crédito no país. De lá para cá, a
cada conjuntura de desaquecimento econômico, como agora, o problema
ressurge.


A crise financeira global deu novo impulso à consolidação bancária. A
maior foi a fusão do Itaú com o Unibanco, anunciada em 3 de novembro de
2008. Mas ocorreram outras de grande porte: a compra do Real pelo
Santander e a da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil.


O Bradesco perdeu a liderança entre os bancos privados. Com
oportunidades restritas de aquisições, sobrou ao banco da Cidade de Deus
a opção de focar sua expansão no crescimento orgânico e em políticas
agressivas de marketing e de preços. Mas não deflagrou uma guerra de
preços e tarifas. Optou por colocar ênfase na qualidade dos serviços
prestados. Essa guerra seria declarada depois, já no governo Dilma,
pelos bancos estatais.


No cumprimento de sua missão de irrigar de liquidez a economia, para
combater o estreitamento do crédito, os bancos públicos ganharam mercado
depois da crise externa. “A atuação dos bancos estatais não foi só
anticíclica. Aproveitaram a oportunidade de inibição dos bancos privados
para disputar e ganhar mercado”, diz Costa. E não pararam mais, como
prova a ofensiva atual pela derrubada dos “spreads” bancários.


A crise mundial, ao intensificar a consolidação bancária no Brasil,
forjou gigantes impossíveis de serem comprados por instituições
estrangeiras. O contrário mostra-se mais factível, pois abriu-se uma
nova fase da história: a da internacionalização dos bancos brasileiros.
Esta é a chave para se decifrar o enigma proposto por Costa no título
que escolheu para seu livro. Admite que estava em dúvida entre dois:
Bancos do Brasil ou Brasil dos bancos.


A conjunção coordenativa “ou” pode ser interpretada de várias maneiras.
Pode indicar alternância ou exclusão – “é uma coisa ou é outra” -, pode
refletir uma incerteza (“não sei se os bancos são do país, se o país é
dos bancos ou se é o país dos bancos”) ou, ainda, pode ser usada como
partícula enfática, como na letra do Hino da Independência (“ou ficar a
pátria livre ou morrer pelo Brasil!”). Cabe ao leitor resolver a
charada, ao término da leitura.

“Brasil dos Bancos”


Fernando Nogueira da Costa. Edusp. 531 págs., R$ 74,00

Expediente:
Presidente: Fabiano Moura • Secretária de Comunicação: Sandra Trajano  Jornalista ResponsávelBeatriz Albuquerque • Redação: Beatriz Albuquerque e Brunno Porto • Produção de audiovisual: Kevin Miguel •  Designer Bruno Lombardi