ARTIGO: O pesadelo da imobilidade urbana: até quando?

*Marcos Pimentel Bicalho

O sonho de modernidade se transformou no pesadelo da imobilidade e,
mesmo para a minoria que tem acesso aos automóveis, este modelo dá
sinais claros de esgotamento. O Brasil pratica uma política de Robin
Hood às avessas: há mais subsídio para a produção de automóveis do que
de ônibus; o preço da gasolina é mantido congelado, enquanto sobe o do
óleo diesel, que move a quase totalidade do transporte coletivo ; e
bilhões são gastos em obras direcionadas para a inalcançável meta de
“desafogar o trânsito”, enquanto que investimentos em metrôs e
corredores de ônibus não saem do papel. O artigo é de Marcos Pimentel
Bicalho.

No final do ano passado, na abertura da
reunião do Fórum Nacional de Secretários de Transporte, em João Pessoa, o
Governador da Paraíba, em sua fala, disse, mais ou menos literalmente a
seguinte frase: “as políticas do Governo Federal de incentivo à
indústria automobilística, ainda que tenham tido efeito benéfico para a
economia, foram desastrosas para as cidades brasileiras”.

De
fato, a concessão de incentivos fiscais para a produção de automóveis
foi uma das principais medidas do Governo para enfrentar, com sucesso, a
crise econômica mundial de 2009, e continua sendo peça importante das
ações que visam manter aquecida a economia nacional. Porém, a que custo?

O
Governador se referia aos congestionamentos, a parte mais visível do
problema. Perdas econômicas, para as cidades, e deterioração da
qualidade de vida, para a população, antes sentidas apenas nas grandes
metrópoles, se tornaram parte do cotidiano de todas as cidades médias, e
até de menor porte, guardadas as devidas proporções, é claro.

Outros
graves problemas também decorrem do modelo de transporte abraçado pelo
país, mais intensamente a partir da segunda metade do século passado:
consumo de energia, poluição e acidentes de trânsito também são
externalidades das políticas de mobilidade que moldaram o Brasil para e
pelo transporte rodoviário, e as cidades para os automóveis.

O
sonho de modernidade do século XX se transformou no pesadelo da
imobilidade e, mesmo para a minoria que tem acesso aos automóveis, este
modelo dá sinais claros de esgotamento. Se, no início, ter um carro
conferia ao seu proprietário pleno acesso a todas as oportunidades da
vida urbana, em comparação com as condições dadas àqueles que usam os
meios de transporte coletivo, hoje, esta garantia não existe mais. Ainda
que em condições mais vantajosas, os usuários do transporte individual
também sofrem hoje para se deslocar, presos nos congestionamentos que
eles mesmos provocam.

Se sofrem os privilegiados, padecem ainda
mais aqueles que dependem do transporte público, preteridos nos
incentivos fiscais, ignorados nos investimentos públicos e abandonados
na gestão cotidiana do espaço público de circulação.

O Brasil
pratica uma política de Robin Hood às avessas: há mais subsídio para a
produção de automóveis do que de ônibus; o preço da gasolina, que
movimenta os automóveis, é mantido congelado, enquanto sobe o do óleo
diesel, que move a quase totalidade do transporte coletivo urbano; e
bilhões são gastos em obras viárias (duvidosas) direcionadas para a
inalcançável meta de “desafogar o trânsito”, enquanto que investimentos
em metrôs e corredores de ônibus não saem do papel.

Esforços
inúteis! Obras viárias faraônicas, cada vez mais caras, prometidas como
solução para os problemas do trânsito, têm vida útil cada vez mais
curta, quando já não são inauguradas saturadas, em função do vertiginoso
crescimento da frota de automóveis, e, mais recentemente, de
motocicletas, em circulação.

Não há solução para o deslocamento
diário de grandes quantidades de pessoas que não seja o transporte
público, de qualidade e a preços acessíveis, para a população. Mais do
que nunca são necessários investimentos continuados, dos três níveis de
governo, na expansão da infraestrutura destinada ao transporte coletivo
urbano. A recente retomada dos investimentos federais no setor, com os
PACs da Copa e da Mobilidade em Grandes Cidades (acima de 700 mil
habitantes), deve ser louvada, mas é modesta e insuficiente para atender
as necessidades de um país cada vez mais urbano.

E, por fim, não
basta investir na melhoria do transporte público, ainda que isto seja
necessário e urgente. Serão necessárias, em paralelo, crescentes
restrições econômicas (pedágio urbano) e operacionais (rodízio),
destinadas a reduzir o uso do transporte individual. Como o espaço
viário é escasso, ele precisa ser destinado para o uso dos meios mais
eficientes de transporte, isto é, aqueles que transportam um maior
número de pessoas ocupando menos espaço e com menores custos sociais.

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