A presidenta Dilma
Rousseff anunciou na noite desta quinta (10) os sete nomes que vão
integrar a Comissão da Verdade (CV), criada há quase seis meses
para investigar violações aos direitos humanos ocorridas entre 1946
e 1988, período que inclui a ditadura militar (1964-1988).
São
eles: José Carlos Dias (ex-ministro da Justiça do governo Fernando
Henrique), Gilson Dipp (ministro do Superior Tribunal de Justiça),
Rosa Maria Cardoso da Cunha (advogada da presidenta e do seu
ex-marido durante a ditadura), Cláudio Fonteles (ex-procurador-geral
da República no governo Lula), Paulo Sérgio Pinheiro (diplomata com
farta experiência em legislação internacional da ONU e da OEA),
Maria Rita Kehl (psicanalista e escritora) e José Cavalcante Filho
(jurista).
Confira a biografia dos escolhidos – O
presidente da Fundação Perseu Abramo e ex-ministro dos Direitos
Humanos no governo Lula, Nilmário Miranda, avalia que o conjunto vai
atender perfeitamente aos objetivos da Comissão. Ele, que chegou a
ter seu nome indicado por familiares dos mortos e desaparecidos da
ditadura militar, elogiou cada uma das pessoas escolhidas pela
presidenta, em especial os advogados José Carlos Dias e Rosa Maria,
que o representaram quando sofria perseguições do regime.
“Quando
meu nome foi cotado, eu mesmo afirmei que não tinha o perfil comum
aos membros escolhidos para as comissões dos outros países, que é
o de personalidades que não representam setores específicos. Além
de que os remanescentes dos porões da ditadura começaram a criticar
que a instalação da comissão se transformaria em revanchismo. Os
perfis escolhidos pela presidenta evitarão estas acusações”,
afirmou à Carta Maior.
O ex-ministro destacou também que a
instalação da Comissão se dará em um momento de importante
mobilização da sociedade civil. De acordo com ele, é a primeira
vez, desde o período pré-anistia, que há movimentos de rua
motivados pela causa. Além de que dois estados já instalaram
comissões estaduais, em onze outros tramitam propostas de criação
e há comitês e fóruns sendo montados em universidades, sindicatos
e organizações civis. “Essa movimentação é muito importante,
porque uma Comissão da Verdade só dá certo se contar com forte
participação da sociedade civil”, observou.
O
ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Brito,
que se destacou na luta pela criação da CV, disse que tinhas
expectativas de que as indicações fossem mais ousadas. “Nós
esperávamos nomes ligados à CNBB [Confederação Nacional dos
Bispos do Brasil], à família do Vladimir Herzog [jornalista morto
durante a ditadura] e de militantes históricos como o ex-ministro
dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda”, esclareceu.
Segundo
ele, o perfil dos indicados é mais técnico do que militante.
Entretanto, ressaltou que os nomes são irrelevantes diante da
importância do trabalho que os membros terão a frente. “O
principal é o compromisso com o nosso direito fundamental à memória
e à verdade, direito já cristalizado pela legislação
internacional. O importante mesmo é que a Comissão cure o Brasil da
amnésia que nos impuseram ao negar a verdade histórica sobre a
ditadura militar”, disse.
Ex-exilada política e
representante do Comitê pela Verdade, Memória e Justiça do
Distrito Federal, Iara Xavier Pereira destacou que, apesar de não
haver nenhum nome que justifique um veto, se sentiu “pouco
acolhida” entre os indicados. Ela criticou, principalmente, o
perfil majoritariamente jurídico dos escolhidos. “Com exceção da
Maria Rita, que é psicanalista, e do Paulo Sérgio, que é
sociólogo, todos os demais têm formação em Direito. São pessoas
não muito afeitas ao tema, sem muita intimidade. Nossa expectativa
era que a CV tivesse comprometimento, bagagem e conhecimento
suficiente para enfrentar as dificuldades que deverão surgir.
Afinal, será um trabalho enorme para um grupo pequeno e em um curto
espaço de tempo”, justificou.
Iara afirma os comitês e as
associações dos familiares dos desaparecidos políticos farão uma
reunião para avaliar, conjuntamente, o perfil dos indicados e, só
aí, definir se apoiarão ou não a Comissão. Segundo ela, nenhum
dos nomes indicados pelos familiares consta na lista. E dos nomes
propostos pelos comitês, apenas o de Maria Rita Kehl.
Beatriz
Affonso, representante no Brasil do Centro pela Justiça e Direito
Internacional (Cejil), entidade signatária da ação que levou a
Organização dos Estados Americanos (OEA) a condenar o Brasil pelos
crimes ocorridos na Guerrilha do Araguaia, disse ter muitas
expectativas que o trabalho da comissão ajude a garantir justiça às
vítimas do período. “A criação da CV não faz parte do
resolutivo da sentença, mas temos esperanças de que possa vir a
somar com o trabalho que vem sendo feito por justiça às vítimas da
ditadura”, afirmou.
Ela afirmou ter ótimas referências
sobre a advogada Rosa Maria, que representou não só a presidenta
Dilma, como vários outros ex-presos políticos durante o regime.
Entretanto, manifestou preocupação com a indicação do ministro do
STJ, Gilson Dipp, que atuou como testemunha de defesa do estado
brasileiro no caso Araguaia, manifestando posição favorável à
interpretação da Lei da Anistia, de 1979, que favorece aos
militares, perdoando-os por todos os crimes praticados. “Nos
preocupa muito que pessoas com este tipo de posição estejam na
lista, mas esperamos que desvinculem o trabalho que exercerão na
Comissão de suas convicções pessoais”, afirmou.
A posse
da comissão da Verdade ocorrerá no próximo dia 16, às 11 horas,
em cerimônia no Palácio do Planalto, que, segundo o porta-voz da
Presidência, Thomaz Traumann, irá contar com as presenças já
confirmadas dos ex-presidentes Luís Inácio Lula da Silva (PT),
Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Fernando Collor de Mello (PTB) e
José Sarney (PMDB).