Oficina dos bancários no FST reforça regulação do sistema financeiro

“A
regulamentação do sistema financeiro deve atender os interesses da
sociedade e não os dos bancos.” A avaliação é da professora
e economista da Unicamp, Maria Alejandra Madi, que fez palestra
durante a oficina “Outro Sistema Financeiro é Preciso”,
realizada na tarde desta sexta-feira (27), no auditório da Casa dos
Bancários, em Porto Alegre, dentro da programação do Fórum Social
Temático (FST) 2012, que tem como tema “Crise Capitalista,
Justiça Social e Ambiental”.

Mais de 50 pessoas
participaram da atividade, promovida pela Contraf-CUT em parceria com
o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre (SindBancários),
Fetrafi-RS e CUT-RS. Estiveram presentes dirigentes sindicais do Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Rio de Janeiro.

A
mesa da abertura foi integrada pelo secretário de imprensa da
Contraf-CUT, Ademir Wiederkehr, a presidenta em exercício do
SindBancários, Rachel Weber, e o diretor de formação da
Fetrafi-RS, Carlos Augusto Rocha.

“Desde o início do
Fórum Social Mundial, em 2001, os bancários vêm cobrando a
regulamentação do sistema financeiro. Este ano não podia ser
diferente, ainda mais depois da crise financeira nos Estados Unidos e
na Europa”, disse Ademir. “Está na hora de realizar uma
conferência nacional sobre o sistema financeiro, a fim de ouvir a
sociedade sobre a atuação dos bancos, que dependem de autorização
do Banco Central (BC), mas não atendem os interesses da sociedade”,
destacou o diretor da Contraf-CUT.

Rachel disse que “a
oficina sobre o sistema financeiro é importante e está inserida no
conjunto de atividades do SindBancários no FST”. Um dos
destaques foi o lançamento com debate do livro “A Privataria
Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr, ocorrido na
quarta-feira (25). A obra avalia a farra das privatizações no
governo FHC, que entregou vários bancos estatais aos banqueiros
nacionais e estrangeiros.

O diretor da Fetrafi-RS ressaltou
que a luta pela regulamentação do sistema financeiro não pode ser
exclusiva dos bancários, mas devem ser protagonistas. “Já na
década de 90 os bancários construíram um projeto de lei para
regulamentar o artigo 192 da Constituição Federal que trata do
sistema financeiro”, lembrou. “Precisamos aprofundar esse
debate e envolver o conjunto da sociedade”, assinalou.

Bancos
zumbis, caixas pretas e sem regulação –
A professora fez uma
palestra de quase uma hora, apontando que “a crise financeira de
2008 ainda não acabou” e comparou os bancos a zumbis. “São
mortos vivos”, explicou. “Desde o início da crise, não há
sinais de melhora nos bancos da Europa”, salientando que “a
crise europeia é uma crise soberana” englobando bancos e
governos.

Maria Alejandra chamou a atenção que a crise
mostrou que os bancos viraram caixas pretas, pois escondem
informações e hoje os investidores não confiam neles. “Falta
regulamentação e supervisão”, ressaltou. “Os bancos
passaram dos limites”.

Ela observou que, com a crise, os
bancos estão fragilizados. O acordo de Basileia III, de 2010, feito
com a lógica de “quanto mais riscos, mais capital” e que
impõe limites, sofre muitas pressões dos bancos, mesmo com o prazo
de implantação das medidas até 2019.

“Muita coisa
ainda vai acontecer”, previu. “Mas os bancos terão que
controlar a alavancagem e ter padrões de liquidez”.

A
economista alertou que “quem domina as finanças internacionais
é o modelo anglo-americano”, concentrando as grandes operações
(empréstimos, derivativos, câmbio, taxas de juros e fundos).
“Qualquer mudança tem que passar pelos Estados Unidos e
Inglaterra, porém os bancos não querem mudar nada”, enfatizou.
Ela contou que o governo Obama possui dois grupos de estudos: um a
favor da regulação e outro contrário.

Em relação ao
Brasil, Maria Alejandra salientou que os cinco maiores bancos
concentram 90% dos ativos. “Isso aumenta o poder dessas
instituições”, apontou.

Ela lembrou que, em abril de
2003, foi aprovada uma lei que permite a regulamentação fatiada do
sistema financeiro, “criando um Frankenstein”. Apesar
disso, “as atuais normas do sistema financeiro não são
resultados de leis e sim de resoluções do Banco Central”.

A
economista criticou as resoluções do BC que ampliaram a atuação
dos correspondentes bancários, o que também precarizou as relações
de trabalho. “O Brasil está inserido na dinâmica da maior
subordinação da economia ao sistema financeiro”, denunciou.
Segundo ela, “isso gera problemas de controle, auditoria
interna, ouvidoria e fiscalização”.

Bônus dos
executivos –
Maria Alejandra também abordou a resolução 3921,
do Banco Central, que trata da remuneração variável dos
administradores. Ela obriga os bancos a formar comitês de
remuneração, com três integrantes. No mínimo 50% da renda
variável deve ser paga em ações ou em instrumentos financeiros
baseados em ações.

Ela explicou que os bônus milionários
dos executivos foram um dos motivos da crise internacional. “A
política de remuneração deve ser compatível com os riscos”,
observou.

Para Maria Alejandra, a crise oferece oportunidades
para mudanças com impactos sobre a sociedade e o futuro dos
trabalhadores.

Debates – Após a palestra, os
participantes da oficina fizeram vários questionamentos sobre
questões como a independência do BC, a ampliação do crédito, o
alto spread dos bancos, o endividamento dos clientes, a política de
metas abusivas e o papel dos bancos públicos. Também foram
apresentadas propostas como a redução das taxas de juros, a taxação
sobre as transações financeiras (taxa Tobin) e o fim dos paraísos
fiscais.

A professora criticou os juros dos bancos, lembrando
as diferenças entre as taxas que algumas instituições praticam
aqui e nos países de origem. Ela disse que BB e Caixa deveriam agir
para mudar essa realidade. “Os bancos públicos não pode ter a
mesma gestão dos bancos privados”, afirmou.

Para ela, “o
BC ganhou muita autonomia, é o quarto poder da nação, mas deveria
estar a serviço da sociedade”.

A economista observou
ainda que certas questões do sistema financeiro, como o
endividamento, podem trazer pressões políticas e ameaças para a
cidadania e a democracia, atingindo direitos conquistados pela
sociedade.

Avaliação – Para Ademir, a palestra foi
muito importante, ampliando o debate, dando continuidade às
discussões dos bancários e envolvendo a sociedade. “Foi uma
aula de sistema financeiro, economia e cidadania”.

“Terminamos
2011 com a realização de um seminário internacional sobre o
sistema financeiro, em Santiago do Chile, durante a reunião das
redes sindicais dos bancos internacionais da UNI Américas Finanças.
E agora começamos 2012 com a oficina sobre a regulamentação do
sistema financeiro no FST”, apontou.

“O tema é
muito complexo e desafiador. Tenho certeza de que é possível
mostrar como a sociedade é vítima da ganância dos bancos quando
paga tarifas abusivas e os juros mais altos do planeta e ainda sofre
com a insegurança”, apontou. “Outro sistema financeiro é
preciso”, concluiu.
 

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