Rodeado por jovens solícitos por fotografias e
autógrafos na saída do teatro do Hotel Renaissance, em São Paulo,
o professor francês Christophe Dejours pode ser considerado uma
celebridade. Longe dos modelos hollywoodianos, o pesquisador de pouco
menos de 1,70 de altura e óculos arredondados, é um dos precursores
e principais estudiosos da psicodinâmica do trabalho no mundo, tema
sobre o qual se debruça há 30 anos.
Convidado especial do
Seminário Internacional Saúde do Bancário, promovido pelo
Sindicato dos Bancários de São Paulo na quarta-feira 24 de agosto,
Dejours participou da quinta e última mesa de debates com o tema
“Psicodinâmica do Trabalho e Construção da Saúde do
Bancário”.
Animado mesmo após uma maratona de
palestras iniciadas ainda no começo da manhã – o psicanalista
assistiu a todas -, Dejours falou sobre a necessidade da
solidariedade entre os colegas de trabalho. Incentivou o movimento
sindical a seguir na luta contra o assédio moral e mostrou-se
satisfeito com o que viu e ouviu. “As pessoas têm dificuldades
de se conhecer e se ajudar mutuamente. Falta solidariedade e isso é
culpa de um modelo de gestão neoliberal”, avaliou.
Professor
titular da cátedra de Psicanálise-Saúde-Trabalho e diretor do
Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Ação, do Conservatório
Nacional de Artes e Ofícios, instituição ligada ao Ministério da
Educação da França, ele recebe em seu escritório, com certa
regularidade, envelopes contendo convites de empresários.
São
pedidos de socorro para que o professor e sua equipe intervenham na
gestão de suas empresas, onde funcionários adoecem e vivem em alto
grau de estresse. “A empresas mudam seus postos de direção.
Entram pessoas mais gentis. Mas, por não saberem como fazer, estes
agem da mesma maneira que seus antecessores.”
Dejours
considera grave a avaliação individual de desempenho, que para ele
está voltada a uma questão muito específica do trabalho, a do
resultado. “Não há proporcionalidade entre aquilo que você
consegue avaliar como resultado final e o esforço que as pessoas
fizeram para chegar lá. Essa avaliação é parcial”, observa.
Ele usa como exemplo a rotina dentro dos bancos. “Você
pega uma agência bancária situada na periferia, onde o poder de
compra é menor. Provavelmente será necessário mais esforço para
vender, inclusive muito menos do que alguém que trabalha num bairro
com condições econômicas melhores.”
Ele acredita que a
saída seja a alternância de uma visão individualizada para uma
visão coletiva. “É necessário reconstruir a cooperação e
solidariedade. Não há uma teoria da cooperação, um método ou
algo mais substancial. O que temos são pistas que vão nesse
sentido.”
Suicídios – Na França, após a
privatização em 2004 da France Telecon, maior empresa de telefonia
do país, uma série de funcionários cometeram suicídio, o que
desencadeou acalorados debates sobre as condições de trabalho.
Entre 2008 até abril desse ano, 32 trabalhadores se mataram. Alguns
deixaram cartas de despedida culpando a companhia e sua gestão
opressiva.
“É importante estudar o suicídio nas
empresas que foram privatizadas. Existe uma questão que é o
conflito sobre qual é o valor do trabalho. O serviço público, a
princípio, é equitativo. Não importa se a pessoa é grande ou
pequena, a questão é a universalidade de oportunidades, um regime
igualitário”, destaca o professor.
O pesquisador afirma
que a privatização das empresas públicas rompe com esse processo.
“A igualdade de oportunidades não é o que mais importa e sim
obter cada vez mais clientes e mais dinheiro. Com isso o trabalhador
passa a agir de forma que ele mesmo reprova e não sabe mais o que é
bom ou o que é mal.” O resultado disso, segundo o estudioso, é
um sistema que favorece a perseguição e o assédio.
Christophe
Dejours observa ainda que muitas empresas não permitem intervenções.
“São locais extremamente fechados, onde não se tolera
discussão sobre as condições de saúde e trabalho. Os
trabalhadores devem se organizar, solidarizar e cooperar mutuamente
para a construção de um melhor ambiente.”