Na solenidade de
abertura da Marcha das Margaridas, ativistas e ministros exaltaram o
poder de diálogo conquistado pelo movimento de mulheres do campo e
da floresta a partir da mobilização social. Desde 2000, elas rumam
à capital federal para protestar e cobrar o poder público a cada
quatro anos. Na quarta edição, iniciada nesta terça-feira (16), a
conquista de espaço junto ao poder público foi motivo de
comemoração, mas as demandas por avanços no combate à
desigualdade de gênero ainda são amplas.
O primeiro dos dois
dias de mobilização começou com a recepção às comitivas de
todas as regiões do país. A estimativa das organizadoras é de que
50 mil mulheres estejam instaladas na Cidade das Margaridas, montada
no Parque da Cidade, em Brasília. Há expectativa de que seja
possível alcançar a meta de 100 mil até esta quarta-feira (17),
quando ocorrem as manifestações propriamente.
Os alojamentos
onde estão instaladas as mulheres do campo, da floresta e da cidade
têm cobertura e piso de lona. Sobre a forração de plástico é que
são posicionados os colchonetes durante a noite. As filas longas são
regra durante as refeições, mas reina o espírito de
solidariedade.
Nesta terça, além de receber as delegações,
houve a prepração para a marcha, com oficinas de formação e duas
mesas de debate sobre desenvolvimento sustentável, relacionados aos
sete eixos que compõem a pauta entregue ao governo na semana
passada. À tarde, uma solenidade marcou o lançamento da
marcha.
Visíveis – Apesar do atraso de quase
duas horas, o ato foi prestigiado por ministros de Estado e
parlamentares, além de Agnelo Queiroz, governador do Distrito
Federal. Carmem Foro, coordenadora geral da Marcha das Margaridas,
secretária de Meio Ambiente da CUT e secretária de Mulheres
Trabalhadoras Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (Contag), lembrou que muitas das mulheres deixaram suas
casas há dois ou três dias, tomando barco e ônibus como meio de
transporte, para chegar até Brasília.
Carmem Foro se definiu
como uma “cabocla da Amazônia”, citando sua origem na área
rural do Pará, que integra o bioma. “Muitas mulheres aqui
presentes veem de uma realidade política bem difícil. Muitas aqui
eram invisíveis e, desde a primeira marcha, em 2000, conseguimos
quebrar essa invisibilidade política. A quarta marcha de amanhã
(quarta-feira) tem muita importância para todas as mulheres, porque
é a primeira vez em que marcharemos tendo uma mulher como presidenta
da República.”
Rosane Silva, Secretária da Mulher
Trabalhadora da CUT e da coordenação da marcha, ressaltou que o
modelo de sociedade defendido pela marcha é um modelo em que todas
as mulheres sejam livres de fato. “Nós da CUT não nos sentimos
somente parceiros da marcha, mas parte dela, pois a agenda de
reivindicações da marcha fazem parte da luta da CUT, com o destaque
para duas: a política de valorização do salário mínimo e reforma
agrária”.
Rosane ainda destacou a luta por creche pública
de qualidade para trabalhadoras rurais e urbanas, atualização do
índice de produtividade da terra, além da ratificação da
convenção 159 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que
prevê igualdade de direitos entre homens e mulheres no mercado de
trabalho.
Estiveram presentes também como representantes da
CUT, Vagner Freitas, Secretário de Administração e Finanças, e
Jacy Afonso, Secretário de Organização.
Uma das
homenageadas foi a pernambucana Elizabeth Teixeira, de 86 anos. Viúva
do fundador das Ligas Camponesas João Pedro Teixeira, assassinado em
1962, ela criou sozinha 11 filhos no meio rural. A escolha foi uma
forma de lembrar das mulheres ameaçadas ou assassinadas no campo.
Segundo a Contag, em 10 anos, as mulheres ameaçadas de morte na
região amazônica passaram de 7% para 20% dos nomes listados
anualmente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Iriny
Lopes, ministra da Mulher, foi a única representante do governo a
falar. Ela confirmou que, ao participar da marcha, nesta
quarta-feira, a presidenta Dilma Rousseff anunciará medidas do
Executivo federal para atender à pauta de reivindicações entregue
na semana passada pelas lideranças da Contag.
“O Estado
precisa fazer sua parte para que seja superada a desigualdade de
gênero”, defendeu Iriny. “Mas já adianto aqui para vocês
que, com certeza, a presidenta Dilma irá fazer diversos anúncios
para que sejam cumpridas as pautas que vocês apresentaram a nós nos
próximos quatro anos, ainda no governo da Dilma.”
O
presidente da Contag, Alberto Ercílio Broch, relembrou a primeira
marcha, em 2000, quando a mobilização teve como alvo o modelo
neoliberal promovido pelo governo do então presidente Fernando
Henrique Cardoso. Desde então, o ato se incorporou à agenda das
mulheres no país e, hoje, é considerada a maior mobilização de
mulheres da América Latina. “As mulheres aqui presentes são
sofridas, simples, humildes e ajudaram a viabilizar a marcha.”
Apesar de a lista de reivindicações das ativistas ainda ser
extensa, Broch reconheceu avanços em relação à política para os
agricultores familiares e para comunidades extrativistas.