Apesar
dos avanços sociais conquistados no Brasil ao longo do governo Lula
(2003-2010), a redução da pobreza e da desigualdade no Brasil ainda
se assenta sobre bases frágeis. Segundo estudo divulgado na
quinta-feira (4) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada), as mudanças foram puxadas pela oferta de empregos de
baixa remuneração no setor de serviços e comércio.
Dos 2,1 milhões de novos postos de trabalho
criados por ano na década de 2000, 95% pagavam até 1,5 salário
mínimo (R$ 817,5). Enquanto isso, a cada ano foram eliminadas 397
mil vagas com salário de três mínimos ou mais. O fenômeno está
ligado à mudança na estrutura da produção, afirma o presidente do
Ipea, Marcio Pochmann. “Não é mais a indústria que comanda.
São os setores de serviços.”
Na década, esses setores
geraram 2,3 empregos para cada vaga na indústria — a relação era
de 1,3 nos anos 1970. Serviços e comércio respondem agora por 57,6%
da ocupação, contra 42,6% nos anos 1980. Já a proporção da
indústria e da construção civil (24%) não mudou.
“A
sustentação dos êxitos recentes não depende só da qualificação
da mão de obra. Para o longo prazo, é preciso ampliar a oferta de
empregos que sejam de maior remuneração”, diz Pochmann.
O
estudo destaca que, em boa parte devido aos aumentos reais do mínimo,
o crescimento do emprego concentrado na base salarial contribuiu para
reduzir a fatia de pobres na população ativa, de 37,2% em 1995 para
7,2% em 2009. Na classificação do instituto, porém, a maior parte
do contingente de novos assalariados foi engrossar o “nível
inferior” da pirâmide social: “Não é mais pobre, mas
tampouco de classe média”.
Enquanto isso, a parcela que
o Ipea classifica como de “nível médio” (combinando renda
a fatores como escolaridade, consumo e moradia) se manteve em 32%. Os
que vivem de lucro, juros, terras e aluguéis passaram de 3,9% para
14,3%.
O Ipea vê uma “polarização” entre as
“duas pontas” com maior crescimento relativo na pirâmide:
“os trabalhadores na base e os detentores de renda derivada da
propriedade”. Hoje, só 16,4% dos empregados ganham três
mínimos ou mais, contra 28,7% em 2000 e 25,9% em 1990 (considerando
valores atuais do salário). Para Pochmann, a estagnação do “nível
médio” explica parte da redução no grau de desigualdade da
distribuição da renda do trabalho, que foi de 10,4% entre 2004 e
2010 — índice inédito desde os anos 1960.
“A questão
é como sustentar esse padrão”, diz o presidente do Ipea. “Se o
salário mínimo não mantiver uma trajetória de crescimento,
podemos ter postos com remuneração muito baixa, e com isso não
termos capacidade de reduzir mais a pobreza e a desigualdade, que
ainda é muito grande.”