Com
vistas ao Dia Internacional dos Povos Indígenas, comemorado em nove
de agosto, a Anistia Internacional lançou ontem (4) o relatório
Sacrificar os direitos em nome do desenvolvimento: os povos indígenas
da América sob ameaça, em que expõe violações sofridas em
consequência dos grandes projetos de “desenvolvimento” em
países de todo o continente americano.
Desrespeito
ao direito de consultas prévias e consentimento livre,
desalojamentos forçados, construção de megaempreendimentos em
territórios indígenas, criminalização das lideranças, violência
contra as mulheres e até assassinatos compõem o triste quadro a que
estão expostos os indígenas da região – estimados em 40 milhões.
De
acordo com o relatório da Anistia, baseado em casos e testemunhos
dos indígenas concedidos à organização, na base das violações
recorrentes está uma “arraigada atitude discriminatória contra
os povos indígenas da América”.
Isso
aparece claramente nos projetos desenvolvimentistas, ligados à
mineração, energia elétrica, infraestrutura e turismo, quando os
indígenas são identificados como “estorvo” ao progresso.
“A
falsa e perigosa dicotomia entre desenvolvimento e direitos dos povos
indígenas é habitual no continente. Se trata de uma crença baseada
na falsa premissa de que os projetos da indústria extrativa ou de
outro tipo, que multiplicam a riqueza e são, portanto, favoráveis
aos interesses nacionais, não devem ser obstruídos pelos povos
indígenas, que são apenas uma pequena parte da população”,
critica.
Como
resultado dessa visão, governos nacionais e atores privados não
respeitam o direito à consulta e consentimento livre, prévio e
informado em todos os países da região, como Argentina, Brasil,
Canadá, Colômbia, Equador, Guatemala, México, Panamá e Peru.
No
Brasil, por exemplo, as comunidades indígenas do rio Xingu, no
estado do Pará, região amazônica, estão em luta contra o projeto
da hidrelétrica de Belo Monte, que implicará em deslocamentos
forçados e intensos impactos sócio-ambientais. Mesmo com a ordem da
Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) de suspender o
projeto devido a imprecisões no estudo de impacto ambiental, as
obras prosseguem.
Batalha
semelhante é travada pelos indígenas mexicanos, contra a
hidrelétrica La Parota, no estado de Guerrero, e pelos
guatemaltecos, contra a mina de ouro e prata Marlin, localizada no
departamento de San Marcos.
Em
meio a tudo isso, os indígenas enfrentam processos penais que,
segundo o relatório, são “desproporcionais e parecem atender a
motivações políticas”. No Chile, quatro líderes mapuche, em
luta pela permanência em seu território, foram julgados sob a Lei
Antiterrorista e decidiram fazer greve de fome durante três meses
deste ano para pedir justiça e o fim da estigmatização ao seu
povo. No dia 3 de junho, a Suprema Corte de Justiça do Chile reduziu
as penas dos mapuche, porém, rejeitou o pedido de anulação do
julgamento.
Também
as meninas e mulheres indígenas sofrem muitas violações. No
Canadá, elas têm entre três e cinco vezes mais chances de morrer
vítimas de violência. Já nos Estados Unidos, o relatório compara
a situação a uma epidemia. “Mais de uma de cada três mulheres
indígenas será violada ao longo de sua vida, e quase 86% dos
violadores são homens não indígenas”, informa.
Apesar
da conjuntura de desrespeito aos direitos, a Anistia celebra a
resistência que as comunidades ousam construir. “Os povos
indígenas têm se organizado cada vez mais para defender seus
direitos, e na atualidade estão liderando uma luta por seus direitos
e a igualdade. (…) A Declaração das Nações Unidas sobre os
Direitos dos Povos Indígenas é reconhecida já em toda a região,
desde que Canadá e Estados Unidos, que votaram inicialmente contra,
subscreveram-na em 2010”, diz.
Demandas
– Para garantir os direitos indígenas, a Anistia Internacional
cobra que os governos estabeleçam aliança com os povos indígenas
para promulgar leis que efetivam o direito à consulta e
consentimento livre. Além disso, não devem apoiar projetos de
desenvolvimento que possam afetar as comunidades sem antes realizar
consulta; precisam agir para resolver os conflitos de terra
existentes e proteger as mulheres indígenas, julgando e castigando
violadores.
O
relatório, na íntegra, está disponível no link
http://www.amnistia.org.pe/descargar/Sacrificar_derechos.pdf