Crédito a produtor familiar avança mas perde espaço em uma década

De
2000 a 2010, financiamento do governo à agricultura familiar
quadruplicou mas fatia no crédito a todo setor rural caiu pela
metade. Avanço do agronegócio primarizou pauta de exportações
brasileiras durante a década, diz estudo. Em marcha por Brasília,
Contag muda o foco, abre mão de cobrar ampliação do crédito e
agora quer turbinar garantia de renda.

O financiamento oficial à agricultura familiar
quadruplicou em uma década mas, desde 2008, perde espaço no
orçamento federal e, hoje, dentro da política de crédito do
governo para todo o setor rural, representa menos da metade do que
representava há dez anos. E a tendência é que essa proporção
caia, quando o governo anunciar o plano safra 2011-2012, nas próximas
semanas.

Maior sindicato do setor, a Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) realiza a partir
desta terça-feira (17/05) sua marcha anual de reinvindicações, o
Grito da Terra, pedindo que o financiamento à agricultura familiar
seja igual ao da última safra. A entidade acredita que, agora, é
mais importante cobrar recursos para “garantir renda ao
produtor” do que exigir ampliação de uma linha de crédito que
o segmento não consegue aproveitar na totalidade.

No ano passado, o governo reservou R$ 16 bilhões
para a agricultura familiar no plano 2010-2011. A agricultura
comercial ficou com R$ 100 bilhões. A fatia “familiar”
correspondeu a 14% do total de R$ 116 bilhões destinados à
agropecuária. Na safra 2000-2001, o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) levara 33% dos
recursos. Foram R$ 4 bilhões, de um total de R$ 12 bilhões, de
acordo com o ministério da Agricultura.

A queda na proporção da agricultura familiar
dentro dos financiamentos oficiais ao setor rural, ao longo da década
passada, ocorreu mesmo que os pequenos tenham sempre recebido mais
dinheiro do que no ano anterior. O orçamento do Pronaf aumentou
quatro vezes (de R$ 4 bilhões, em 2000-2001, para R$ 16 bilhões) em
dez anos. Já a verba dirigida à agricultura comercial cresceu a uma
velocidade duas vezes superior. Passou de R$ 12 bilhões para R$ 100
bilhões.

“Enxergamos essa realidade como o avanço do
agronegócio no Brasil. Nos últimos anos, o governo tem dado
prioridade ao superávit na balança comercial e depende das
exportações de commodities para isso”, diz o secretário de
Política Agrícola da Contag, Antoninho Rovaris.

Exportações
de commodities –
Durante a década passada, as vendas ao exterior
de produtos primários, as commodities de que fala Rovaris, como
carne ou soja, ampliaram o peso nas exportações brasileiras.
Respondiam por 37% em 2000 e tornaram-se majoritárias em 2010 (51%),
segundo estudo divulgado dia 10 de maio pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), que aponta “primarização” da pauta
exportadora do país. Para o Ipea, a “primarização” seria
um problema que o país deveria debater.

Para a Contag, há outros fatores que também
explicam a perda de espaço da agricultura familiar no financiamento
ao setor rural. Por exemplo: a impossibilidade de os produtores
pegarem empréstimos por não quitarem dívidas passadas, não terem
renda suficiente, nem título de regularização fundiária. Por isso
que o Grito da Terra 2011 estará satisfeito se o governo repetir
para a agricultura familiar, na safra 2011-2012, a linha de crédito
de R$ 16 bilhões. “Em outros anos, pedimos mais dinheiro mas não
conseguimos aplicar. Agora, resolvemos mudar o foco das
reivindicações”, afirma Rovaris.

Dados do ministério da Agricultura mostram que,
de fato, é mais difícil para a agricultura familiar usar todo o
dinheiro que o governo federal lhe reserva. Entre a safra 2000/2001 e
a 2008/2009, a verba efetivamente repassada ao segmento variou de 52%
a 75% do total separado em cada plano. No caso dos grandes
produtores, o repasse oscilou de 92% a 135% e só em dois anos ficou
abaixo do previsto – nos demais, foi sempre preciso completar o que
estava disponível inicialmente.

Diante disso, a Contag acredita que faz uma aposta
melhor para seus associados ao enfatizar, na negociação com o
governo em 2011, o reforço de políticas que não oferecem os
entraves legais do Pronaf. É o caso do Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA), pelo qual o governo compra a produção familiar. A
Contag cobra R$ 2 bilhões para o PAA de 2011. É um pleito
ambicioso. Supera tudo aquilo que foi aplicado entre 2003, quando foi
criado, e 2010: R$ 1,7 bilhão, segundo a Companhia Nacional de
Abastecimento (Conab), operadora do PAA. “A grande questão para
nós, hoje, é como turbinar a garantia de renda”, diz Rovaris.

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