Eduardo Campos: “Dilma ganha. Vai ser uma eleição com emoção”

O governador eleito que teve a vitória mais avassaladora no
primeiro turno das eleições, Eduardo Campos (PSB) venceu nos 184
municípios de Pernambuco, seu Estado. Neto do ex-governador Miguel
Arraes e aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Campos prevê a
vitória da candidata Dilma Rousseff no segundo turno, mas não se furta a
fazer reparos à campanha da coligação governista no primeiro turno.
Campos diz
que agora no segundo turno está concentrado na campanha para eleger
Dilma. “Tenho falado sempre com a coordenação, com a própria candidata e
as tarefas que tenho recebido, tenho procurado cumprir e passar para os
vários companheiros do PSB. Acho que as coisas estão caminhando bem”,
relata.

Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Terra – O
senhor foi o governador mais votado do Brasil nestas eleições. Venceu
em todos os 184 municípios de Pernambuco e em mais de 80% desses
municípios, se eu estiver errado me corrija, com mais de 90% dos votos.
E, ontem à noite, foi a Granito, onde obteve 99,1% dos votos. Em um
município de pouco mais de cinco mil eleitores, apenas 23 votaram
contra. Como explicar isso?

Eduardo Campos – O que
explica isso é o trabalho que estamos fazendo, o momento que Pernambuco
vive. Na verdade, inauguramos uma forma diferente de fazer política no
Estado. Que era marcado por disputas políticas muito acirradas, um tempo
em que a política foi feita de maneira muito agressiva recentemente.
Nós ganhamos as eleições de 2006, surpreendendo a muitos que imaginavam
que nós iríamos alimentar esse tipo de política. Surpreendemos com a paz
política em Pernambuco. Fomos tratar de trabalhar. Não de desqualificar
nossos adversários. Fomos tratar de inovar a gestão pública, de ampliar
a margem de investimentos do estado, que multiplicamos por quatro. De
tirar do papel uma série de investimentos que eram o sonho de Pernambuco
há muitos anos. E tudo isso foi feito dentro de um ambiente de respeito
e humildade. E agora estamos colhendo o que nós plantamos.

Terra
– Se imaginava a velha política, o ódio, a rivalidade, porque se
imaginava que o senhor tentaria vingar a derrota do seu avô, Miguel
Arraes, contra o mesmo Jarbas Vasconcelos (PMDB). Não é isso?

Eduardo
Campos
– Isso mesmo. Exatamente isso. Em 2006, já tivemos a
oportunidade de vencer a eleição e quem comandava o palanque em 2006, o
governo que terminava naquela data que sucedi, não era o governo de
Mendonça (Filho) (DEM). Era o governo Jarbas. No segundo turno, Jarbas
esteve mais na televisão do que o próprio candidato, o Mendonça. E nós
fizemos aquele debate, do segundo turno, com muito equilíbrio. Fomos
pras propostas, fomos mostrar pra onde o Brasil estava indo, as mudanças
que haviam ocorrido no mundo e a necessidade de Pernambuco voltar a ter
futuro. Pernambuco não viver de contar o que já tinha sido ou do ciúme
dos estados vizinhos. Era hora de unir o Nordeste e embalar Pernambuco,
para ele voltar a crescer. E o que está acontecendo? Crescimento com
qualidade, com respeito à natureza, crescimento com inclusão social,
crescimento distribuído no estado, crescimento em setores que portam ao
futuro. Fazer uma grande transformação na estrutura de educação, da
valorização da educação para a cidadania e para o trabalho, com
investimento em ciência e tecnologia. Com inovação na gestão pública,
podendo fazer com que Pernambuco possa tanto na saúde, como na segurança
pública, ter programas que são de estado e inovadores. Tudo isso foi
surpreendendo. Então, essa coisa de alimentar o revide, não veio, não
gravou, e as pessoas sentiram isso na minha atitude. Nós não
discriminamos ninguém, quem já foi discriminado como nós fomos não
tolera essa discriminação. Fomos trabalhar. Plantamos e estamos colhendo
os frutos de uma nova política.

Terra – O senhor teve 82% dos
votos e a candidata Dilma Rousseff (PT), teve 62%. O que o senhor prevê
para o segundo turno?
Eduardo Campos – Nós tivemos uma
diferença da nossa votação pra votação de Dilma aqui em Pernambuco, de
700 mil votos. Destes 700 mil, 520 foram na Região Metropolitana. E na
borda da Metropolitana, tá o restante dessa diferença. No interior, o
voto foi muito casado…

Terra – Casado, é com os interesses
locais?

Eduardo Campos – Veio muito junto. Na Região
Metropolitana, na prática, tive os votos da Dilma e da Marina (Silva)
(PV), que votaram praticamente nesse movimento junto conosco. O
crescimento da Marina se deu nos últimos dias da campanha.

Terra
– E ai, as teses são várias…

Eduardo Campos – É… Eu
acho que tem dois votos muito claros que dá pra identificar, indo pra
Marina. O voto da comunidade evangélica, ou até do católico mais
conservador, que foi se dirigindo pra Marina. E o outro, que é um voto
mais da juventude, da esquerda, da intelectualidade do Recife, de
ativistas do movimento social… Que foram se distanciando por esse ou
aquele motivo do PT, de Dilma. É meio que mandar um certo recado, pras
pessoas terem mais humildade. Não queriam derrotar o projeto do
presidente Lula. Queriam, na verdade, correção de rumo. Queriam afirmar
valores que Marina passou a carregar. Uma eleição sem muita emoção. E,
em algum momento, encontraram na candidatura de Marina, depositaram ali,
na candidatura de Marina, uma emoção na relação com valores que ela
carrega, da preservação, do cuidado com a natureza, da preocupação com a
ética na política, que todos nós temos. Mas naquele momento ela
expressou essa oportunidade no voto. Eu vejo um segundo turno aqui com
uma grande vitória de Dilma. Acho que grande parte desse eleitorado que
votou em Marina em Pernambuco, no segundo turno vai pra Dilma. Hoje, ela
(Dilma) deve ter mais de 70% dos votos.

Terra – O PSB elegeu
três governadores. Disputa com mais três governadores e o senhor
certamente está acompanhando as pesquisas no País. Na região Norte e
Nordeste, qual o quadro agora? A perspectiva?

Eduardo Campos
– Eu acho que o nosso conjunto é francamente majoritário no segundo
turno aqui no Nordeste. Temos dois que estão diretamente envolvidos. Na
Paraíba, onde nós já viramos no primeiro turno na frente. Estamos
confirmando o ex-prefeito de João Pessoa, Ricardo Coutinho (PSB), que
representa, na verdade, a renovação da política da Paraíba, necessária. E
outro que é no Piauí, onde já viramos na frente e estamos confirmando
essa liderança. No Norte nós temos um segundo turno no Amapá, com Camilo
(Capiberibe), uma jovem liderança do nosso partido que quero crer que
também vai ter êxito na eleição. Acho que no Nordeste, Dilma vai ter uma
votação muito expressiva, acho que a média pode apontar pra algo em
torno de dois pra um. Na região toda, como uma média regional. E no
Norte também vamos ter uma frente que vai se confirmar nas urnas.

Terra
– Onde está o problema na região, no segundo turno?

Eduardo
Campos
– Em alguns estados onde a eleição estadualizou-se. Onde o
posicionamento no primeiro turno, meio que estadualizou a posição da
candidatura dela (Dilma). Onde ainda tem uma força mais expressiva, como
em Alagoas, onde o presidente Lula perdeu eleições no passado.
Resultados mais apertados como tivemos em Sergipe, na Paraíba, mas acho
que a campanha do segundo turno nos dá a oportunidade de vencer nestes
estados. E de ampliar a margem com os resultados que vamos colher em
Pernambuco, na Bahia, no Ceará e no Maranhão.

Terra – De que
forma tem retomado a campanha com os eleitores? Através da mídia?
Viagens? E qual o recado? O que o senhor está dizendo pra ele?

Eduardo
Campos
– Na verdade, essa campanha no segundo turno, onde não tem
segundo turno estadual é feita de uma maneira muito especial. Porque
muitos palanques foram desmontados, a estrutura dos deputados estaduais,
federais, dos próprios senadores, do governo, prefeitos… Ai a gente
tem que remontar tudo. Fomos a cada uma das regiões chamando as
lideranças, já fizemos reuniões no Sertão e na Região Metropolitana.
Vamos fazer no Agreste pernambucano e na Zona da Mata, já na próxima
semana. E a mensagem é ir pra rua. Fazer a diferença em Pernambuco, pra
ajudar no Brasil. Nós tivemos no Estado muitas parcerias estratégicas,
com o presidente Lula e é a hora da gente confirmar…

Terra –
O senhor utiliza uma frase: não me tome com uma mão…

Eduardo
Campos
– Isso foi na eleição. Quando terminou a votação, a
apuração, que o nosso adversário reconheceu a derrota, sai para ir até o
Marco Zero da cidade do Recife, uma grande praça onde se faz as
atividades políticas mais expressivas e é tradicional ir lá, agradecer a
multidão de pessoas e militantes, que ficam acompanhando o resultado
das eleições. Quando cheguei lá, recebi vários cumprimentos, mas antes
de ir para o palanque, um senhor me abraçou, cumprimentou pela vitória e
disse: Eduardo, fica tranquilo. Porque o povo de Pernambuco não vai lhe
dar essa vitória com uma mão e tomar com a outra. Quando ele disse
aquilo eu disse: que frase interessante. É uma síntese.

Terra –
E o que significa isso? Transpondo para o internauta do resto do
Brasil?

Eduardo Campos – É você dar a oportunidade de
alguém governar o estado, e não dá a oportunidade de você ter um
presidente aliado. Que é tão importante para as parcerias que Pernambuco
viu serem feitas com o presidente Lula. É como dar ao presidente a
vitória e dar um Congresso contra, um Senado contra ou uma Câmara
contra. Ou seja, a população sabe que quando todo mundo já tá ajudando
em uma direção, já é difícil fazer. Já é difícil realizar. Quando fica,
uns puxando pra um lado, e outros puxando pra outro, fica muito mais
difícil.

Terra – No Congresso já está delineado, com uma
maioria…

Eduardo Campos – Dilma terá uma maioria no
Congresso muito maior que o presidente Lula teve. Por exemplo, Lula
enfrentou grandes dificuldades.

Terra – Há quem
veja isso como salutar. Se eventualmente o candidato José Serra (PSDB)
ganhar. Um equilíbrio de poderes. O senhor acredita nisso?

Eduardo
Campos
– Sinceramente, se alguém deseja defender a candidatura de
Serra, que não use esse argumento. Até porque a história tem nos dito
que a base de sustentação parlamentar tem sido muito importante para o
êxito dos governos. Mesmo que o parlamento viva no mundo inteiro, e no
Brasil também, uma crise de identidade, que é necessário ser discutida, a
relação do poder executivo com o parlamento precisa mudar sua natureza.
Precisamos deixar de ter a relação do executivo com parlamento na base
dos cargos. A participação deve-se dar pela eficiência, pelo resultado
das ações que valorizem o mandato. As funções parlamentares são duas, as
principais funções. Uma: que é da representação. E a outra que é da
fiscalização. A da representação, na medida que a democracia amadurece,
que a sociedade se organiza, que os meios de comunicação e as
ferramentas de comunicação são ampliadas, as pessoas podem através da
ouvidoria, órgãos, ampliar suas opiniões, os conselhos são ampliados e a
sociedade exige cada vez mais representação.

Terra – Há um
descompasso entre a quantidade e a velocidade de meios; não que se deva
se render aos meios, mas há a possibilidade de se manifestar muito mais
rápido e o parlamento, ainda no século XIX…

Eduardo Campos
– Isso, regras que fazem que as votações se arrastem, se alguém tem
interesse, por horas e horas. Você interdita decisões que estão na ordem
do dia e que você necessariamente… Precisa rever, precisa rever. Essa
é a crise da representação. E a outra, que é a crise do controle. Da
fiscalização. Porque os órgãos de controle, sejam eles do controle
externo, como por exemplo, o próprio Tribunal de Contas da União,
Tribunal de Contas dos estados, Ministério Público Estadual, Ministério
Público Federal, eles foram se capacitando… A democracia deu
estruturação à criação desses órgãos, que ganharam carreira, pessoas,
profissionais que passaram no concurso e são qualificadas… Na verdade,
a parte que mais funciona no serviço público. Eles passaram a exercer
essa fiscalização com muito mais capacidade técnica que o próprio
parlamento. Então, você tem duas crises que precisam ser observadas. A
crise da representação e a crise da fiscalização pra fazer o controle. E
ai, outra questão que coloca essas duas questões em xeque, que é a
relação que o Legislativo tem com o Executivo. O voto do parlamento é
muitas vezes dado na função do fazer, da função executiva, mais do que a
representação. E isso exige uma reforma política séria no País, pra
aproximar a política do povo.

Terra – Mas esse é o discurso de
toda eleição. Vamos fazer a reforma política, vamos fazer a reforma
política…

Eduardo Campos – Sabe por que não faz? Porque
quer fazer para a próxima eleição. Quem vai votar, olha pra norma e
diz: essa é melhor ou pior pra mim? Agora, quando a gente pensar em
fazer uma reforma política pra próxima década, e uma reforma tributária
pra próxima década, a gente vai fazer. E não vai chegar na próxima
década com essa mesma conversa, que já tem duas décadas.

Terra
– Mas como é que se faz?

Eduardo Campos – Com um pacto
político, um pacto político. Podendo compreender que um País do tamanho
do Brasil, com a importância e conceito internacional que o Brasil tem,
com o relevo que nossa economia ganha pra o mundo, não pode ter um
sistema tributário como esse. Que é vergonhoso. Que inibe a geração de
emprego, que onera a produção, o investimento… A gente não pode ter
também uma democracia tão jovem – afinal de contas, de 1989 pra cá são
21 anos que votamos pra presidente da República – e a cada ano temos uma
legislação. Quando não tem uma legislação, tem uma resolução do TSE. Ou
seja, quem tem responsabilidade com isso são os políticos, que precisam
fazer uma reforma política decente, adequada, que valorize a cidadania,
a proximidade da política com o povo. Acho que é possível fazer. Outros
países fizeram, porque o Brasil que já fez reformas tão importantes não
pode fazer essa?

Terra – O senhor tem conversado, suponho,
com o comando de campanha da candidata Dilma. Tem palpitado? O que você
acha que deve ser corrigido nesse segundo turno? Seja na campanha
específica, no discurso, na televisão… Onde você acha que está
pegando?

Eduardo Campos – No primeiro dia eu já fui
chamado pra participar daquela reunião. Acho que foi muito pouco, porque
foi uma visão geral do Brasil, muitas pessoas falaram… E logo ali eu
disse: olha, agora é a hora de centrar o comando, as informações foram
passadas, mas não podemos ficar toda a hora ficar dando um palpite. E a
gente termina atrapalhando, né? Nós falamos naquele primeiro momento e
acho que muita coisa que observamos a gente já vê de mudança. E tenho
falado sempre com a coordenação, com a própria candidata e as tarefas
que tenho recebido, tenho procurado cumprir e passar para os vários
companheiros do PSB. Acho que as coisas estão caminhando bem.

Terra
– Tem visto o programa de televisão?

Eduardo Campos – Tenho.

Terra
– O que acha?

Eduardo Campos – Acho que o programa foi muito
bom no primeiro turno, melhorou no segundo turno, porque botou mais rua,
mais emoção, mais proximidade e tem mais tempo também… Agora…

Terra
– Tem gente se queixando também da ausência do presidente Lula. Dizem
que tem uma dicotomia ai. Ou a candidata se constrói sozinha, com a
ausência absoluta e total dele ou se vive esse dilema. Isso existe
mesmo?

Eduardo Campos – Eu acho que como diz o ditado:
nem tanto ao mar, nem tanto a terra. Acho que é preciso ter dos dois. No
Brasil, a gente viu que teve muito disso na ida ao segundo turno, a
associação de Dilma com a sociedade brasileira, com a grande massa dos
brasileiros e brasileiras, era uma relação muito recente. Nós que
conhecíamos ela, trabalhei com ela e sabia da capacidade dela, da
disposição, da coragem, do preparo técnico… Mas muitas pessoas
conheciam a Dilma de oito meses pra cá. Menos que uma gestação. Então,
queriam conhecer um pouco mais. Foram tantos os bombardeios que ela
sofreu… O que não é novidade. Porque o Lula sofreu com isso, Getúlio
(Vargas) passou por isso, o Juscelino (Kubistchek) passou por isso, no
plano local, a gente viu outras lideranças passarem por isso… Então,
era um desejo de conhecer mais e é importante que o guia mostre sua
história…

Terra – O guia é o horário eleitoral no
“pernambuquês”.

Eduardo Campos – É (risos). É importante
que o programa eleitoral mostre essa trajetória dela, a capacidade, a
forma espontânea dela falar… Isso é muito importante. A relação dela
na rua, como as crianças cuidam dela, como os mais velhos, os mais
jovens já expressam sua esperança na candidatura dela. E é muito
importante ter o presidente Lula, que é o avalista, né? O avalista
diante do povo, da Dilma. Nós avalizamos também. Mas o grande avalista é
o presidente Lula e é fundamental que ele entre e fale, fale não só com
a razão, mas fale com o coração e diga ao Brasil o que ele nos disse lá
no início, quando defendeu o nome de Dilma para que todos nós
pudéssemos apoiar.

Terra – O senhor falou em “campanha
fascista”, logo ao final do primeiro turno. Objetivamente, o que o
senhor quis dizer com isso?

Eduardo Campos – Uma campanha
que invadiu a privacidade, com mentiras sobre a vida pessoal de
candidatos. Isso é insuportável. O século XXI tá ai e sou de uma geração
que não quer cometer os mesmos erros que outras cometeram. Que a gente
possa fazer algo que melhore, pra que a próxima (geração) venha, e
melhore mais ainda. A gente não pode ficar calado, a gente que tem
responsabilidade, nós que lutamos pela democracia, que prezamos valores
importantes pra vida pública, não podemos assistir a juventude
brasileira ser bombardeada com campanhas que invadem a privacidade de
candidato A ou B. Não faço isso. Porque enfrentei uma campanha dura no
meu estado, sempre estive aqui mantendo a coerência do que estou dizendo
e que estou falando. Fui atacado durante toda a campanha e não fui pra
baixaria. E tive um resultado que foi o maior da história de Pernambuco,
o maior da história de eleições para um governo de estado, exatamente
porque tive a capacidade de repudiar esse tipo de política.

Terra
– Ela (Dilma) teria sido vítima de uma campanha fascista?

Eduardo
Campos
– Sim, sim.

Terra – Isso leva à outra frase sua
que eu li: “a briga com a mídia foi uma briga errada”.

Eduardo
Campos
– Eu acho. Eu acho e disse isso. Disso isso à coordenação da
campanha de Dilma e disse isso na reunião com o presidente da
República. Um valor fundamental para a maturação da democracia, que nós
todos somos responsáveis por ela, que é um valor que distingue um país
no conceito internacional de outras nações emergentes que é: o Brasil
tem uma democracia. Tem instituições que têm procurado funcionar pra
resolver esses problemas. Não são ideais? Não. Tem muita falha? Tem. Mas
nós temos uma democracia que nos custou caro e que a gente precisa
aperfeiçoar a cada dia. Um dos valores dessa democracia é a liberdade de
imprensa. Liberdade de imprensa para que muitos órgãos e veículos,
meios… Assumam inclusive um lado na política.

Terra – Essa
foi a observação que o presidente fez. Mais ou menos, ele disse o
seguinte: que na verdade, grande parte da imprensa tem lado, não se
manifesta como tal objetivamente, e com subterfúgios, joga o jogo. O
senhor concorda com essa concepção?

Eduardo Campos
Alguns assumem claramente. Você viu veículos que fizeram editoriais e
assumiram.

Terra – Sim. O Estadão fez, a Carta Capital fez…
Eduardo
Campos
– Acho que isso já é sinal de outros tempos, o sinal da
maturidade… O Estadão fez, a Carta Capital fez… Agora, acho que esse
debate foi proposto por que? Porque foi colocado dentro de uma reta
final de campanha, no calor de uma paixão política…

Terra –
Onde não se tem como ganhar…

Eduardo Campos – Onde não
se tem como ganhar. Não se tem como ganhar esse debate. É um debate que o
País deve travar com muita maturidade, até porque, a sociedade
brasileira também pode se expressar reclamando de um veículo ou
criticando um veículo. Do mesmo jeito que o veículo tem a liberdade e
deve ter, que eu vou morrer defendendo essa liberdade de expressar sua
opinião contra as minhas convicções, eu também posso expressar minha
opinião. A respeito do resultado e tal… Agora, eu acho que naquela
oportunidade, estávamos apontando pra ganhar a eleição no primeiro
turno, tendo construído uma candidata que nunca foi candidata antes. Até
então. Estávamos tendo uma grande votação para os governos estaduais,
como tivemos. De senadores, de deputados… Aquilo pareceu algo que…
aparentava sapato alto. E ai, como você sabe, tem o fato e tem a versão.
O que ficou da impressão era que não era o debate sobre a imprensa,
sobre o papel informativo, conceitual e tal. Foi vendido como uma forma
de calar. E ai, ninguém vai defender algo que cale, que empastele, que
engesse a liberdade de imprensa. Porque foi com a liberdade de imprensa
que nós construímos a democracia…

Terra – Mesmo que a
realidade possa ser até outra.

Eduardo Campos – Ser
outra. Ai é outro debate. Um debate que deve seguir. Mas não vamos fazer
esse debate na porta de uma eleição.

Terra – Foi posta também
nessa eleição uma questão geracional. O senhor foi eleito o governador
mais bem votado, o Aécio Neves (PSDB-MG) teve uma votação para o Senado
excepcional, elegeu o Itamar Franco senador, o Beto Richa (PSDB-PR), o
mesmo com o Tarso Genro (PT), no Rio Grande do Sul… Qual o quadro que o
senhor vê para o futuro mais próximo?

Eduardo Campos
Eu acho que a geração pós-64, os filhos já da democracia, estão chegando
à cena brasileira. À cena dos estados e devem chegar trazendo inovação.
Carregando valores que vêm lá de trás, de justiça, de equilíbrio, de
respeito à cultura brasileira, da identidade nacional… Mas que deve
também trazer preocupações que são da pauta mais atual, como crescer
respeitando a natureza, como garantir a transparência da gestão
pública… Profissionalismo e gestão que são duas questões importantes,
como aliar a gestão e o profissionalismo na gestão, com a capacidade de
fazer o povo participar e ouvir o povo no que é prioridade. Ou seja,
isso são questões que vão estar na ordem do dia do Brasil que cresce em
importância no conceito internacional. Um Brasil que quer efetivamente
buscar a construção de grandes consensos nacionais que embale o projeto
de nação, que é muito maior que projetos de partidos ou projetos de
pessoas.

Terra – A eleição do Serra significaria certamente
uma pedra nesse caminho (da nova geração). E a eleição da Dilma,
evidentemente, acacianamente, uma outra coisa (no mesmo sentido). O que
significaria uma eleição ou a outra em sua percepção?

Eduardo
Campos
– Acho que as pessoas muitas vezes, na política, os quadros
políticos, podem representar aquilo que não desejam, não é? Porque não
imaginam que vão representar. Eu digo isso porque o Serra é um
brasileiro que todos nós respeitamos. Sabemos da história, do preparo
técnico de Serra, sabemos que ele ajudou, como tantas outras lideranças,
às lutas do Brasil pela redemocratização… Mas hoje o que ele
representa é bem diferente do que Dilma representa. Dilma representa um
projeto de continuidade de modelo de desenvolvimento nacional, de
crescimento com inclusão. De possibilidade de inserção soberana do País e
possibilidade de termos crescimento econômico bem distribuído no
território nacional. Possibilidade de participação da sociedade
organizada na decisão de governo, na possibilidade de avançar ainda mais
no que Lula pode, do ponto de vista da gestão… A gente tem a
compreensão que é isso que Dilma representa. Veja Bob, o Brasil
conseguiu com grande esforço a estabilidade econômica, o fim da
inflação. Que durante duas décadas matou o crescimento dos
trabalhadores, da possibilidade de crescimento do País. A gente percebe
que o fim da inflação não foi suficiente pra colocar o País em um novo
ciclo de crescimento e desenvolvimento econômico. O que possibilitou
isso foi a redução da desigualdade. A desigualdade é uma questão que
Dilma coloca como centro do seu debate político. A sua intervenção foi e
ainda é o grande freio na economia brasileira. Um país como esse tem
que contar com seu mercado interno. E não vai se fazer mercado interno
sem gerar oportunidade, aumentar o número de pessoas que podem
empreender ou se empregar. É aumentar o financiamento à produção no
Brasil, aumentar a inclusão do caminho da educação, da capacitação
técnica… Então, vejo claramente que o projeto de Dilma é um projeto
que aponta pra o futuro. Você sabe que o processo decisório, de eleição,
mexe com dois sentimentos: saudade e esperança. E eu não vejo saudade
em relação ao que foi o governo de Fernando Henrique e que o Serra
participou. E aqui, não sou daqueles que dizem que o governo Fernando
Henrique só teve equívoco, de jeito nenhum. Tem muitos equívocos, mas
vamos ver naquele tempo social. Teve um significado ali. Teve erros ali
que podemos apontar, mas também teve acertos. Mas nós percebemos que não
tem essa saudade. E quem mexe com a esperança? Acho que quem mexe com a
esperança de poder ir além do que Lula pode ir é a Dilma, e as forças
que a apoiam. E espero que Dilma faça um governo mais inovador, que
Dilma possa fazer um governo que reconstrua o fundamento da relação com o
aparelho de estado, o governo, o Executivo e os partidos políticos. Uma
parte desses votos que Marina teve, da estudantada, da juventude, ela
teve afirmando a necessidade de uma mudança nesse padrão.

Terra
– De alguma forma, por mais absurdo que possa parecer a tese, os votos
do Tiririca significam também uma satirização do que há na política? O
Tiririca, os tiriricas?

Eduardo Campos – É… É um voto
claro de protesto. Não é? Entendo como um voto de protesto. Mas já
vivemos em outras eleições a expressão desse voto também assim. Mas
também tem muita gente que foi eleita com qualidade, com militância, com
correção, dedicação à causa pública, com envolvimento nas lutas do
campo, na cidade… Pessoas que são guardiões dessa oportunidade de
mudar a política pra melhor. De limpar a política com o voto.

Terra
– Podemos dizer que o voto no Tiririca foi um chute no balde, um
alerta, não é?
Eventualmente, o Tiririca pode ser até um bom
parlamentar. Não estou desqualificando o voto.

Eduardo Campos
– É a expressão de um protesto. De um grito de alerta. Esse grito de
alerta pode, e deve ser ouvido por quem tem responsabilidade. E acho que
todos nós podemos dar uma contribuição para ser melhor. Na política
quando a gente deixa de sonhar, a gente perde a razão de estar fazendo a
política. Eu acho que pode ser melhor. Eu não acho que está bom e que
aqui pode parar. A gente pode fazer política contando com a participação
de mais pessoas, que fazem a política com decência.

Terra –
Reabrir a porta pra quem está se afastando da política…

Eduardo
Campos
– Trazer de volta. Ver as pessoas… Muitas vezes eu me
pergunto: tem pessoas na oposição que guardam os valores que nós
guardamos, e muitas vezes a gente se vê obrigado, ou se vê na aliança
com pessoas que não têm tanta identidade assim conosco. Por que? Por que
não dialogar e juntar os bons? Acho que é chegada a hora de fazer essa
pergunta. Juntar os bons do Brasil.

Terra – Falando nisso, o
senhor agora governador e o senador Aécio caminharão juntos? Em algum
momento? Em um futuro próximo?

Eduardo Campos – Já
caminhei ao lado de Aécio muitas vezes. Caminhei ao lado, quando ele
acompanhava o avô dele e eu acompanhava o meu avô, e a gente não apitava
muito, só ficava ali prestando atenção. Você se lembra disso. Depois
caminhamos como parlamentares, como deputados juntos. Eu participei da
conspiração – vamos dizer assim, já que se trata de mineiro – da
articulação para que Aécio fosse presidente da Câmara e ele foi um
belíssimo presidente. Naquela época eu era oposição ao governo Fernando
Henrique, mas fiz com muito prazer a campanha dele para presidente da
Câmara e não me arrependo. Pelo contrário, tenho muita boa recordação
daquela época que levou Aécio à presidência da Câmara e dali pode ele
seguir seu destino e ser governador de Minas, e ser um bom governador de
Minas. O meu partido passou a apoiar o governo dele, ele teve um gesto,
junto com (Fernando) Pimentel (PT), com o nosso partido… Juntaram
pessoas que não eram do mesmo conjunto político. Ele, Aécio e Pimentel
se juntaram em torno de uma candidatura do meu partido, do Márcio
Lacerda, que é um belo quadro, pra tomar conta de Belo Horizonte e veja
que agora, nesta eleição, votando em Dilma, fazendo campanha de Fernando
Pimentel, meu partido votou em (Antônio) Anastasia (PSDB). Eu acho que a
experiência de governo de Aécio em Minas Gerais, foi uma experiência
que fez bem a Minas Gerais.

Terra – Você foi de Dilmasia.
Eduardo
Campos
– É. Vamos juntar os bons. Vamos juntar quem pode tocar pra
frente e melhorar, que é o que interessa ao povo. A maioria do povo não
tem partido. Não vai ser candidato a vereador, prefeito, deputado, a
senador… O povo tá preocupado que a coisa melhore. Preocupado com o
País. A gente pode… Isso não quer dizer que pensamos tudo da mesma
forma, não é assim. Às vezes dentro do mesmo partido não se pensa…
Imagine quem tem partidos diferentes. Mas tem questões, valores que
podemos somar. O Brasil é muito maior que tudo isso e é chegada a hora
de juntarmos as pessoas de boa vontade desse País para consolidar a
entrada do Brasil no século XXI, e do nosso povo na cidadania, na escola
que funciona, na saúde que precisa melhorar esse financiamento… E
muitas vezes a gente alimenta brigas e disputas que dizem mais respeito à
disputa pessoal, de interesse eleitoral, e que não tem nada a ver com a
vida do povo.

Terra – Pra encerrar, a três semanas, quem
ganha?

Eduardo Campos – Dilma ganha. Vai ser uma eleição
com emoção, mas com vitória para nós.

Expediente:
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