A última pesquisa de intenção de voto para senador no estado de
Pernambuco, divulgada pela empresa de pesquisas Ibope no último final de
semana e realizada entre os dias 31/ago e 02/set, aponta Humberto Costa
(PT) na liderança, com folgados 49%, seguido por Marco Maciel (DEM),
com 35%, Armando Monteiro Neto (PTB), com 34%, e finalmente vindo Raul
Jungmann (PPS), com 9%. Os indecisos somam 32%, enquanto os que
pretendem votar nulo ou em branco somam 17%. A margem de erro é de dois
pontos para mais ou para menos.
antes, Humberto manteve seu índice, Maciel caiu dois pontos, Armando
subiu seis pontos e Raul caiu um ponto.
Podemos perceber por
estes dados duas situações básicas vividas pelas quatro principais
candidaturas ao Senado: de um lado, a tendência de Humberto e Raul a
terem cristalizadas suas posições e, de outro, a consolidação de uma
zona de incerteza envolvendo Maciel e Armando, originada nas tendências à
queda apresentada pelo primeiro e de ascensão verificada para o segundo
à medida em que o pleito eleitoral se aproxima. Pelo mesmo Ibope,
Maciel aparecia com 43% das intenções de voto no mês de julho, enquanto
Armando então só contava com 27%. As tendências verificadas vêm sendo
confirmadas pelas pesquisas realizadas pelos Institutos Datafolha e Vox
Populi.
Marco Maciel foi tido, inicialmente, como franco
favorito por parte de alguns analistas, inclusive devido à sua posição
favorável nos primeiros levantamentos de intenções de voto. Houve,
porém, quem à época julgasse ser cedo para tal conclusão. Havia um fator
indispensável à análise que estava sendo descurado pelos que eram
otimistas quanto à situação do democrata.
Em qualquer eleição
democrática realizada no Brasil e em quase todos os lugares do mundo, em
especial no polarizado Pernambuco, os primeiros segmentos do eleitorado
a se definirem quanto ao seu voto são os chamados hard cores (numa
tradução aproximada, “núcleos duros”), os contingentes tradicionalmente
fiéis às diversas candidaturas. Quaisquer que sejam as circunstâncias,
positivas ou negativas, que envolvam seus candidatos, haverá sempre um
percentual mínimo de votos para as agremiações políticas mais
importantes representantes das diversas posições no espectro político:
esquerda, centro e direita.
O PT e aliados têm seu eleitorado
cativo. Os democratas e tucanos, idem. Eles têm garantidos sempre
patamares mínimos de votos. O eleitorado hard core é aquele que define
seu voto por critérios ideológicos, principalmente, mas também por
outros fatores estáveis como ligações de interesse, admiração pessoal,
tradição política, relações familiares e de amizade, gratidão e outros,
isolados ou combinados entre si. Por conseqüência, define-se
precocemente. Se considerarmos que, pela tradição brasileira, quanto
maior a antecedência do pleito menor o percentual de eleitores
decididos, devemos concluir que quanto maior esta antecedência
logicamente mais peso os hard cores têm nos percentuais de definição de
voto dos levantamentos, circunstância que para um desavisado pode gerar
expectativas ilusórias. Na verdade, pelo que então representam os hard
cores, os resultados de pesquisas realizadas quatro ou mais meses antes
dos pleitos muitas vezes divergem significativamente dos resultados
efetivos destes.
A maioria do eleitorado em nosso país só define
seu voto nas proximidades das eleições, durante a campanha propriamente
dita. Espera pelo guia na TV e rádio, pelo noticiário político, pelos
debates e entrevistas na mídia, na internet e presenciais aos quais
possa comparecer, pelos contatos face a face com candidatos, pelas
conversas e reuniões com amigos, parentes e vizinhos, pela orientação da
sua liderança política, etc. Vivenciando uma democracia já
razoavelmente consolidada, esta maioria direciona-se em sua escolha
fundamentalmente por resultados, avaliando os desempenhos pretéritos dos
diversos candidatos e das forças que compõem as coligações que eles
integram. Pesam, para este contingente, antes de tudo os efeitos
práticos de tais desempenhos para a sua vida cotidiana, benéficos ou
danosos.
Tendo em conta tais fatores, algumas apreciações podem
ser feitas sobre as diversas candidaturas ao Senado em Pernambuco neste
momento.
Humberto dificilmente deixará de ser o senador mais
votado. É o candidato do PT na Frente Popular de Pernambuco, amplamente
conhecido pelo eleitorado do estado e identificado com o Governo Lula,
do qual já fez parte como ministro. Na campanha para o Senado, será o
principal beneficiado pela avaliação fortemente positiva dos oito anos
da gestão do presidente. Conta com o apoio decidido do governador
Eduardo Campos (PSB), largamente favorito à reeleição (chegou a 73% das
intenções de voto na última pesquisa Ibope), e certamente, como também
favorito se beneficiará das deserções do jarbismo. Desponta como o
“segundo” senador de um segmento das lideranças políticas locais mais
conservadoras aderentes à dobradinha Dilma-Eduardo mas dispostas a
apoiar a reeleição do senador do DEM Marco Maciel, que compete na
disputa pela segunda vaga diretamente com o outro candidato da Frente
Popular, Armando Monteiro Neto (PTB). Para estas lideranças ele será o
vínculo com o poder central no objetivo da consecução de projetos e
obras de interesse local. Para o eleitor comum figurará como a
renovação, a atualização de parte da representação do estado na Câmara
alta, atualmente em mãos das forças da situação estadual pré-2007.
Raul
Jungmann vem demonstrando uma incapacidade de evolução positiva junto
ao eleitorado. Em oposição acerba aos Governos Lula e Eduardo Campos,
amplamente bem avaliados no estado, na contramão da tendência fortemente
majoritária do eleitorado a eleger Dilma e reeleger o governador, sem a
envergadura político-eleitoral e o suporte financeiro dos outros três
candidatos, com a deserção da maior parte das lideranças políticas
locais do jarbismo, dificilmente sairá das proximidades do patamar dos
9%. Consciente das dificuldades que enfrentaria para se reeleger
deputado federal (a oposição, espera-se, terá sua representação
proporcional encolhida), Raul optou por ser candidato ao Senado,
solucionando o impasse quanto à segunda candidatura na coligação
Pernambuco Pode Mais, considerada por todos como meramente “olímpica” e,
por isto, rejeitada pelos líderes mais expressivos desta, ciosos na
manutenção dos seus mandatos proporcionais. Busca neste instante apenas
se projetar mais junto ao eleitorado com vistas a disputas futuras, em
particular para a Prefeitura do Recife em 2012. Deverá ser o quarto
colocado nas urnas.
Marco Maciel, o candidato “prá valer” da
coligação Pernambuco Pode Mais, é um quadro histórico e uma liderança do
conservadorismo no país, para o qual exerce a função de intelectual
orgânico formulador de idéias e articulador em nível nacional. Sempre
ocupando um cargo público desde a época do regime militar, do qual foi
quadro destacado, sempre compondo, juntamente com seu partido
(ARENA/PDS/PFL/DEMOCRATAS) o leque de forças à direita do espectro
político, embora de perfil pessoal liberal, na sua carreira política foi
deputado estadual, deputado federal, governador, senador, ministro e
vice-presidente da República, atuando como elo fundamental de ligação
dos grupos oligárquicos regionais do Nordeste com as forças políticas
hegemônicas do conservadorismo em nível nacional, notadamente o
empresariado paulista. Suas teceduras políticas de décadas certamente
criaram vinculações consideráveis com as forças políticas conservadoras
locais no estado. É um ícone dos setores que representa, para os quais
sua reeleição é uma questão de honra, pois sua derrota teria um
significado histórico na política local e exerceria sobre eles um efeito
corrosivo e desagregador. Desfruta de prestígio e boa imagem pessoal em
significativa parte do eleitorado. É um candidato que pode ser tido
como “peso pesado”, com chances reais de vitória. A seu favor, conta
ainda com o fato de nunca ter sido derrotado em eleição no estado.
Mas
Maciel é oposição às situações nacional e estadual, um candidato
afinado com o que atualmente em Pernambuco se identifica como o passado
político, com a situação que a maioria do importante eleitorado
recifense rejeitou já a partir de 2000, desde quando elegeu e reelegeu
candidatos do PT para a Prefeitura, e com o que a maioria do eleitorado
pernambucano começou a rejeitar em 2002, sufragando majoritariamente
Lula nos dois turnos, e concluiu em 2006, quando elegeu Eduardo Campos
governador em segundo turno por ampla maioria e ajudou a reeleger Lula
com votação esmagadora. Trafega na contramão do fluxo político estadual e
nacional. Terá contra si nestas eleições não somente a popularidade do
Governo Lula, mas também o largo favoritismo do candidato ao governo do
Estado da coligação adversária, Eduardo Campos. Em muito pouco poderá se
beneficiar do apoio do seu candidato a governador, Jarbas Vasconcelos
(PMDB), que nas últimas pesquisas de intenção de votos situa-se abaixo
dos 20% e padece de altos índices de rejeição. Conta principalmente com
sua imagem pública remanescente, com o voto ideológico do seu partido e
com seus vínculos com lideranças locais interioranas, o que pode não ser
suficiente para elegê-lo. Sua queda constante nas pesquisas pode
apontar uma dificuldade de expandir seu eleitorado para além dos hard
cores da sua coligação.
Com relação à sua imagem, não há como
esconder sua marca “passadista”, reforçada pelo esforço da sua campanha
de ligá-lo a obras públicas de antanho, inclusive mediante inserções em
seu guia eleitoral de imagens antigas suas. Maciel, na impossibilidade
de esconder sua condição de opositor aos Governos Lula e Eduardo e, ao
mesmo tempo, sem poder atacá-los por tática eleitoral, pretende
convencer o eleitorado de que contribuiu no passado para o bom estado de
coisas atual. Sem discurso nacional ou local alternativo, corre o risco
de passar o recibo de ultrapassado: “Por que ele não conseguiu que na
época dele vivéssemos como hoje?” indagaria o eleitor comum. E mesmo
parte das suas alianças históricas com lideranças locais está ameaçada
pela migração/adesão de muitas delas ao palanque governista.
Armando
Monteiro Neto, empresário industrial, ex-presidente da Federação das
Indústrias do Estado de Pernambuco (FIEPE) e ex-presidente da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), atualmente deputado federal,
desponta como o grande competidor com Maciel no pleito vindouro. Conta
com forte estrutura político-financeira de suporte. Representa na chapa
dos candidatos ao Senado da Frente Popular o vínculo do empresariado
industrial pernambucano com a nova situação política estadual e
nacional. A indústria pernambucana cresceu grandemente dando um salto de
qualidade no período dos dois Governos Lula e, em especial, durante os
anos de mandato do governador Eduardo Campos. Foi o tempo em que o Pólo
Industrial de Suape deslanchou, mas também a fase em que o mercado
interno se expandiu fortemente, como resultado da expansão dos níveis de
renda da população, gerando um efeito dinâmico na indústria em todo o
território estadual.
Armando representa na chapa a outra face do
novo, em complementação ao seu companheiro Humberto Costa. Este
constitui a vertente popular democrática, de esquerda, e ele a versão
empresarial, mais conservadora. Ambos apontam para o futuro, para a
continuidade do “novo tempo”. Configuram a aliança entre os setores
beneficiários do novo quadro econômico-social. Navegam a favor da
corrente, bafejados por um clima eleitoral extremamente favorável. E o
empenho do governador Eduardo Campos na pregação do “voto casado”,
Dilma/Eduardo/Humberto/Armando, para os cargos majoritários favorece,
sobretudo, o último, cuja candidatura é a menos consolidada.
No
confronto entre Marco Maciel e Armando Monteiro Neto, considerado o
quadro mais geral presente das campanhas no estado caracterizado cada
dia mais por uma ampla vantagem nas pesquisas de intenções de votos para
os candidatos governistas nos níveis estadual e federal, não há como
não supor que o clima geral vigente favorece o segundo e entrava as
possibilidades do primeiro. Em termos mais simples, podemos dizer que a
candidatura de Armando denota cada vez mais possibilidades de
crescimento na preferência do eleitorado, enquanto a de Maciel tende a
debilitar-se. Porém ainda é muito cedo para previsões consistentes no
caso dos dois. Teremos de esperar por futuros levantamentos. Ou, talvez,
pelas urnas mesmo.