Dificilmente poderia ter havido ano mais auspicioso para o
Brasil. Isso esteve claro nos momentos finais da conferência de
Copenhague. Obama chegou atrasado, perdeu o bonde da História e,
esnobado pelo presidente chinês Wen Jiabao (que se fez representar por
gente de escalão inferior em reuniões de que Obama participava) invadiu
como um penetra a sala onde se reuniam Brasil, África do Sul, Índia e
China, o BASIC. Foto e relato do New York Times retrataram o quadro
insólito em Copenhague. Obama entrou sem ser convidado. “Vou sentar ao
lado do meu amigo presidente Lula”, disse. O artigo é de Argemiro
Ferreira.
O professor (da Universidade de Harvard) Kenneth
Maxwell – britânico de nascimento, radicado há muitos anos nos EUA –
explicou na véspera do Natal, na sua coluna da “Folha de S.Paulo”, que
“os brasileiros deveriam comemorar o fato de que tenham avançado tanto e
de que um futuro promissor esteja ao seu alcance”. Para ele, “o Brasil
encerra a década bem posicionado para o futuro”.
Brasilianista e
autor de pesquisa que devassou a Inconfidência Mineira (“A Devassa da
Devassa”), Maxwell também publicou outros trabalhos relevantes sobre
Brasil e Portugal (entre eles, “Marquês de Pombal, o paradoxo do
Iluminismo”). Antes expusera o papel de Henry Kissinger no golpe de 1973
no Chile – ousadia que o levaria ainda a deixar a revista Foreign
Affairs e o Council on Foreign Relations.
Comprometido
apenas com a seriedade do próprio trabalho, estava certo ainda ao
contestar, no Financial Times, o medo das “reginasduartes” e o
terrorismo desencadeado pelos tucanos na campanha eleitoral de 2002, o
que reduziu o valor do real a 1/4 do valor do dólar. Agora Maxwell vê o
respaldo de 80% dos brasileiros ao seu presidente, encarado no mundo
como exemplo a ser seguido – e Personalidade do Ano, como proclamou o Le
Monde no dia 24.
Retrato do império em decadência
Na
França da Sorbonne de FHC, coube a um blog do Libération, rival
do Le Monde, contrastar a atuação positiva de Lula na reunião de
Copenhague com a queda de Obama: “Os discursos de Obama e Lula foram
mais do que discursos sobre os grandes desafios que nossos líderes
deveriam discutir em Copenhague. Para mim, marcaram a longa e tortuosa
história do declínio do império americano”.
Anabella Rosemberg,
que assinou dia 18 o texto sob o título (misturando inglês e português) “Exit
USA, boa tarde Brasil!”, definiu o quadro geral da degringolada das
negociações do clima, “com a demissão de uma superpotência (EUA) e a
chegada com brio de uma nação (o Brasil) que há algum tempo esperava,
com paciência, para dar os primeiros passos”.
A recusa em
negociar, para ela, é o primeiro sinal de fraqueza do poderoso. “Nas
três propostas que colocou na mesa, Obama não mostrou flexibilidade.
Teve ainda o cuidado de não assumir a responsabilidade dos EUA pelo
acúmulo das emissões de gas com efeito estufa. Da parte de Lula tudo era
liderança, vontade, ambição. Claro que não é perfeito. A questão não é
essa. Mas mostrou aos olhos do mundo que seu país está preparado para
jogar no primeiro time”.
Ainda na Europa, o maior jornal da
Espanha, El País, já tinha considerado Lula, no dia 10, o
personagem do ano de 2009, entre “Los Cien del Año”, os 100 homens e
mulheres iberoamericanos que marcaram os últimos 12 meses. Coube ao
próprio presidente do governo espanhol, José Luiz Rodrigues Zapatero,
fazer o perfil do governante brasileiro, sob a manchete “El hombre que
asombra el mundo”.
O entusiasmo do conservador Chirac
Disse
o espanhol sentir “profunda admiração” por esse homem que conheceu em
setembro de 2004, na cúpula – organizada pela ONU em Nova York – da
Aliança Contra a Fome, liderada pelo brasileiro. Como correspondente da
“Tribuna da Imprensa”, Globo News, Rádio França Internacional e “Jornal
de Notícias” (de Portugal), tive o privilégio de cobrir aquele evento,
presidido pelo francês Jacques Chirac.
A Assembléia Geral da ONU
começaria dois dias depois, mas governantes do mundo inteiro anteciparam
a chegada a Nova York por causa da reunião de Lula. O maior entusiasta
da cúpula era o presidente francês Jacques Chirac, que falou de sua
admiração pelo brasileiro. Chirac viajaria de volta ao final daquela
reunião, deixando para o chanceler a missão de discursar pela França na
Assembléia Geral.
O esforço incansável da grande mídia brasileira
para esconder, tentar esvaziar ou desmerecer o reconhecimento mundial
pouco afeta a imagem de Lula, dada a frequência com que governantes e
personalidades de vários países se pronunciam de forma positiva sobre
ele. Nos EUA o próprio Obama manifestou explicitamente sua opinião, ao
saudá-lo como “o cara”, o “político mais popular do mundo”.
Por
conduzir no Itamaraty a política externa brasileira, Celso Amorim tem
sido alvo obsessivo do bombardeio de nossa mídia. Na ofensiva foi
denunciado pelo papel antigolpista do Brasil em Honduras. Mas é encarado
com respeito no exterior. David Rothkopf – da revista “Foreign
Policy”, conservadora nas posições sobre América Latina – apontou-o
como “o melhor ministro do Exterior do mundo”.
Quem afinal
ficou bem na foto?
Para desespero de nossa mídia as
avaliações de Lula estão em toda parte – e nada têm a ver com o que ela e
a oposição brasileira dizem. É possível encontrá-las em diferentes
línguas. Na maior revista alemã, “Der Spiegel”, em “Newsweek”, no
“Washington Post”, “New York Times”, etc. Não é um amontoado de elogios
vazios. Eles também se referem a dificuldades e obstáculos a superar.
Mas o tom é sempre positivo, sem as leviandades e irrelevâncias que
inspiram os ataques aqui.
Dificilmente poderia ter havido ano mais
auspicioso para o Brasil. Isso esteve claro nos momentos finais da
conferência de Copenhague. Obama chegou atrasado, perdeu o bonde da
História e, esnobado pelo presidente chinês Wen Jiabao (que se fez
representar por gente de escalão inferior em reuniões de que Obama
participava) invadiu como um penetra a sala onde se reuniam Brasil,
África do Sul, Índia e China, o BASIC.
Foto e relato do New
York Times, seguidos depois por texto também destacado no Washington
Post, retrataram o quadro insólito. Obama entrou sem ser convidado.
Lá estavam Wen, Lula e os governantes indiano e sul-africano: “Vou
sentar ao lado do meu amigo presidente Lula”, disse. Ali remendou num
par de horas o acordo de três páginas para evitar o fracasso, sem ir
além da esperança vaga no futuro.
Para variar Lula ficou bem na
foto – literal e simbolicamente. À direita de Obama, a quem socorrera, e
com a ministra Dilma Roussef à esquerda de Hillary Clinton. Essa imagem
final do ano (a foto acima, sob o título deste artigo) refletiu o papel
do Brasil e de seu presidente. Mais uma vez contrariou a obsessão da
mídia golpista aliada à oposição idem (PSDB-DEM-PPS). Por 12 meses mídia
e oposição tentaram semear o pânico e afogar o país no tsunami da crise
mundial – da qual o Brasil foi o primeiro a sair.